Simone faz do tempo seu aliado e abraça a maturidade com olhar plural: 'Estou muito viva'
Caras
A maturidade é uma bênção reservada para poucos e, aos 74 anos, Simone carrega tal graça com uma elegância incomparável. “Eu nunca me preocupei com a chegada da idade”, afirma a cantora, com a certeza de que está exatamente onde gostaria. Dona de uma mente inquieta, ela chega ao marco de 51 anos de carreira e se destaca como um dos grandes ícones da música brasileira, cuja jornada é pontuada por conquistas, dedicação e uma paixão inabalável pela arte. “Sou muito dura comigo mesma. Tratando-se do meu trabalho, eu sempre acho que posso fazer melhor e que poderia ter feito melhor... eu sou um horror, uma carrasca”, conta ela, aos risos.
“Não gostaria que fosse assim, mas a verdade é que as coisas ficam na minha cabeça de um jeito que não consigo me aquietar e entender que o resultado está bom, parar e curtir o momento, o trabalho que fiz. Fico ouvindo as músicas, pensando no que poderia ser diferente... mas se fosse diferente, não seria o que ouço hoje e gosto. Ou seja, é uma loucura”, fala a baiana, que no ano passado recebeu o Prêmio de Excelência Musical durante o 24º Grammy Latino.
Em entrevista exclusiva para CARAS, Simone não somente reflete sobre sua trajetória profissional e pessoal, mas também faz questão de destacar seu amor pela filha de quatro patas, a inseparável Lola (6). “Ela é um luxo de cachorrinha. Quando nos conhecemos, eu conversei com ela, expliquei que ela não poderia ter medo de avião, já que viajaria bastante comigo, que nossa rotina seria diferente... e, bom, acho que ela me ouviu. Lola é a rainha do meu lar”, conta. A pequena foi um presente entregue pela amiga e apresentadora Ana Maria Braga (74), que já a havia surpreendido anos antes. “Eu gosto muito de animais. Há um tempão, a Aninha me deu a Babi, que ficou comigo por 16 anos. Quando a Lola veio, minha primeira reação foi dizer ‘não’, mas a acolhi e propus a guarda compartilhada com a Ana. É claro que isso nunca existiu”, relembra, aos risos.
– São 74 anos de vida e 51 de carreira... Qual seu maior aprendizado frente a esses marcos?
– Acredito que o ser humano é mutante, ele não pode ficar parado. Seria muito chato ter uma única ideia e achar que aquilo é o certo e nada muda. É preciso muita paciência e determinação, ser resiliente, não se achar incrível o tempo inteiro porque ninguém é. Também aceitar os seus limites e, principalmente, agradecer muito a Deus e não desistir. Todos os dias tem alguém torcendo para que isso aconteça, mas você precisa ter força para não deixar acontecer.
– Para celebrar sua trajetória, veio a turnê Tô Voltando. O que ela representa para você?
– Fiquei sem gravar nenhum álbum por sete anos. Em 2022, fiz o Da Gente, mas pouco tempo depois, em 2023, completei 50 anos de carreira, então mal tive tempo de trabalhá-lo. A gente vinha de uma época muito escura. O mundo e o Brasil também. Tô Voltando celebra a volta à vida, à música, ao social, aos palcos, é ter vencido uma pandemia, ter a possibilidade de tirar um governo que era horroso e voltar a ver as flores, a luz.
– Sua música atravessa gerações. Recentemente você até estreou num festival jovem...
– A gente nunca deve dizer não a essas coisas [festivais]. Claro, eu nunca iria para um festival onde eu ficasse cinco horas de pé sem ter uma estrutura adequada. Já não faz parte de mim. Mas tem outras coisas que eu posso fazer. Eu não estou morta. Pelo contrário, estou muito viva e bem fisicamente! Eu aguento ficar num palco e gosto disso. Como artista, preciso de coisas novas e quero muito dividir o palco com gente que eu admiro e acho diferente de mim.
– Sente algum tipo de conflito de idade com seu público?
– Muita coisa mudou, é verdade. Até a forma de se divulgar uma música. Me lembro que ia para a fábrica aprender como se fazia disco. Atualmente, esse processo ficou muito acessível, é tudo muito rápido. Mas não há conflitos ou preconceitos. O preconceito que pode existir vem dos jovens. O velho não tem preconceito.
– E o cenário musical no Brasil, também mudou?
– A minha geração foi muito especial. As potências de música que tínhamos no Brasil antigamente não são as mesmas de agora, mas tem muita gente boa por aí. Anitta, Ivete, Brown... a diversidade é uma loucura linda e maravilhosa. Aliás, gostaria muito de fazer um trabalho com Emicida, sou apaixonada por ele.
– Gosta de trabalhar com gente mais nova que você?
– É bom estar junto de quem pensa diferente de você. É maravilhoso, um aprendizado para ambos os lados. E você não precisa ser jovem, a idade ajuda, claro, mas você precisa ter o espírito jovem.
– Qual sua maior difuldade acerca desse “mundo atual”?
– Eu acho que a tecnologia afastou um pouco as pessoas. Teve uma época que esse negócio de celular foi muito difícil para mim. Eu não gosto. Eu acho que é muito melhor falar do que ficar teclando o tempo inteiro.
– Você está nas redes sociais...
– Sim, tenho contato com meus fãs por lá, eu só não quero ficar escrava de uma coisa que não é boa para mim, não é boa para minha cabeça e que não acho saudável. Só entrei nas redes sociais durante a pandemia, porque eu precisava fazer algo para não enlouquecer, mas nunca fiquei grudada na tela. Eu não sou obrigada a responder uma mensagem que me mandam na mesma hora, por exemplo. Respondo quando eu puder e se eu estiver a fim de responder.
– Você sempre foi muito reservada na vida pessoal e a discrição é uma de suas características.
– Nunca fui uma pessoa de sair, me expor, de badalar. Eu gosto de ficar em casa, de receber meus amigos, de cozinhar... a cozinha me acalma. Preciso cuidar de Lola, ela é criança cheia de energia e que ama bolinha!
– É fato: o tempo tem sido generoso contigo! Qual o segredo?
– Disciplina. O tempo tem sido meu parceiro, sim, mas eu o ajudo. Faço ginástica, gosto de caminhar na areia da praia, faço fono e fisioterapia toda semana e, recentemente, eu também me arrisquei no jiu-jítsu e adorei.
– Jiu-jítsu?
– Sou formada em Educação Física e já tinha feito judô. Quero voltar à defesa pessoal. Tenho a impressão de que os movimentos no jiu-jítsu são como as notas musicais: se você multiplicá-los, eles não têm fim. É muito bom, a aula te mantém só ali, naquele universo. O tempo passa e você nem vê. Imobilizei o Minotouro, aquele homem enorme! Tudo é técnica, é maravilhoso.
– A ideia de envelhecer é algo que te incomoda?
– Não, eu nunca me preocupei com a idade. Todo mundo fala da crise dos 30 anos, mas eu não senti nada. Quando fiz 50 anos, eu achei legal, porque quando era criança pensava que iria morrer cedo. Eu tinha umas maluquices. E que ótimo que agora tenho 74 anos. Então, crise? Eu não! Estou aí, firme e forte.
– Você se considera uma mulher vaidosa?
– Eu acho que sim. Querer estar bem fisicamente é vaidade? Eu uso armas que eu tenho para me cuidar. Tenho detalhes da idade. É inevitável. Eles chegam, você precisa só aprender a lidar. Gosto de estar cheirosa, banhinho tomado, mas não existe a menor possibilidade de eu passar horas e horas na frente de um espelho.
– E esse cabelo lindo?
– Meu cabelo é totalmente natural. Claro que o volume não é o mesmo, mas ele é o que é. Tem horas que está indomável. Dá trabalho para arrumar, mas eu gosto dele da maneira que é.
– E o seu coração?
– Eu gosto de ser uma pessoa discreta. Eu acredito no amor entre duas pessoas.
– Com tanta vitalidade e vontade de desbravar o novo, quais os seus próximos projetos no universo da música?
– A atual turnê, Tô Voltando, vai até o meio do ano, passando por algumas capitais do Brasil. Depois disso começo a realizar um trabalho novo.
FOTOS: SELMY YASSUDA; BELEZA: ANDRÉ CERUTTI; STYLING: PATRICK DOERING; DIREÇÃO: ADRIANA JORGE; FIGURINO: ACERVO PESSOAL, THE PARADISE E SARA JÓIAS; AGRADECIMENTOS: MGALLERY SANTA TERESA HOTEL RJ E LIBERADO JUNIOR