Cassundé contraria Augusto Melo, afirma nunca ter negociado com VaideBet nem ter exigido comissão
Gazeta Esportiva
Alex Fernando André, conhecido como Alex Cassundé, trabalhou na campanha eleitoral de Augusto Melo, em 2023, e é o proprietário da Rede Social Media Design LTDA, empresa citada no contrato do Corinthians com a VaideBet como a responsável pela intermediação do negócio formalizado no início de janeiro deste ano. Esta participação deu à empresa de Cassundé o direito a receber 7% do valor total do acordo, o que, à época da vigência da parceria, renderia, ao fim do período de três anos, R$ 25,2 milhões, quantia que deveria ser repassada pelo clube, em parcelas mensais de R$ 700 mil. As informações foram reveladas pela Gazeta Esportiva em 12 de abril.
Ao comentar o envolvimento de Alex Cassundé na negociação e o valor da comissão que o Corinthians se comprometeu a pagar, o presidente corintiano explicou que chegou a barganhar com o nomeado intermediário.
“Quando você faz uma negociação com uma empresa, sempre é um amigo, um conhecido seu. Às vezes não é um amigo, mas é um conhecido que tem acesso a você. Ele que traz o patrocínio para você. Está cobrando (…) Eu negociei, eu sangrei de 20(%) para 7(%). Brigamos. ’10, 10, 10 (%)’, eu não pago 10 (%). Eu pago 5(%), até chegar num denominador de 7(%)”, afirmou Augusto Melo, em entrevista ao Canal do Benja, no dia 10 de maio.
A versão do mandatário alvinegro, no entanto, é incompatível com o depoimento que Alex Cassundé deu à Polícia Civil, no último 25 de junho, diante o Delegado Tiago Fernando Correia (responsável por casos de lavagem de dinheiro) e o Promotor de Justiça do Gaeco (Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), Juliano Carvalho Atoji.
A Gazeta Esportiva teve acesso e cópia à íntegra do “Termo de Declarações”, documento que registra o depoimento de Alex Cassundé, concluído após cerca de três horas de esclarecimentos prestados e que refletiu em sete páginas de texto corrido e indireto.
A VERSÃO DE CASSUNDÉ
Durante a prestação de esclarecimentos à Polícia Civil, Cassundé disse “categoricamente” que “em nenhum momento exigiu comissão pela intermediação” do acordo entre Corinthians e VaideBet.
Mais que isso, Cassundé afirmou que “não participou de qualquer negociação” com a empresa, que “não sabia o valor do contrato com a VaideBet e nem quanto receberia” pelo o que chamou de “indicação”, “uma espécie de trabalho de telemarketing”, segundo ele.
Alex Cassundé também disse que tomou conhecimento dos “termos do contrato e do valor da comissão” na véspera do anúncio da parceria, dia 6 de janeiro, portanto, quando foi avisado por Sérgio Moura, então superintendente de marketing do Corinthians, de que o contrato havia sido enviado a ele para assinatura digital.
Cassundé ressaltou à Polícia, neste momento do depoimento, “que o e-mail partiu do setor jurídico (do clube)”, comandado pelo diretor Yun Ki Lee, procedimento que levou Cassundé a entender que “houve a validação do contrato”.
Formado em Administração e iniciante no curso de Marketing, Alex Cassundé salientou, em seu esclarecimento, que “não tem ideia de quanto é o valor de um comissionamento no mercado e também que não foi se informar sobre isso depois de saber do valor (que iria receber)”.
A BUSCA PELA BET
Alex Cassundé não era obrigado a responder os questionamentos na delegacia, ele poderia ter escolhido ficar em silêncio, mas preferiu não se furtar da possibilidade de registrar a versão dele sobre todos os temas abordados.
Entre as respostas, houve detalhamento da relação que se criou entre ele e os dirigentes do Corinthians, em ordem cronológica.
Segundo Alex Cassundé, ele foi “indicado por Sérgio Moura”, “5 ou 6 meses antes da eleição”, com a missão de “alavancar a imagem do Augusto nas lives” e “não recebeu nenhum tipo de remuneração por este trabalho”, sob a esperança de “oportunidades futuras junto ao clube”.
Apesar de dizer que não conhecia Augusto Melo e que apenas o cumprimentou em uma oportunidade, Cassundé admitiu que “uma ou duas lives foram realizadas no estúdio que fica no escritório dele, sede da Rede Social Media Design”.
No depoimento, Cassundé contou que percebeu “alguma oportunidade para intensificar o relacionamento com o Corinthians” uma semana depois de Augusto Melo vencer a eleição. Segundo Cassundé, Sérgio Moura o procurou para saber se ele conseguiria “algum patrocínio para o futebol feminino”.
Questionado pelas autoridades na delegacia, Alex Cassundé reconheceu que “não tem nenhuma experiência com intermediação” e relatou o que fez a partir dali para garimpar um patrocínio para o Corinthians.
O investigado alegou que procurou por “Wesley Estrela”, um amigo proprietário de uma agência digital na Bahia. Segundo Cassundé, “só a partir daí ele foi saber o que era Bet”.
Na sequência, o depoimento relata que Cassundé pesquisou “Bet por Bet, via Google” e que obteve “no ChatGPT algumas dicas de como conseguir contatos”. Assim, ele encontrou o número “de um tal André”, o proprietário da VaideBet.
Cassundé disse à Polícia que perdeu o número de André, mas que entrou em contato naquela oportunidade e foi avisado, pelo próprio proprietário da empresa de apostas, que as conversas avançariam se ele colocasse alguém do clube em contato.
Vale destacar que, em 24 de maio, por meio de nota oficial, a VaideBet, sem citar nomes e sem fazer qualquer referência ao futebol feminino do Corinthians, reconheceu o contato de um “agente intermediário”
“Desde o primeiro momento, a VaideBet foi contatada por um agente intermediário sobre a possibilidade de se firmar um acordo para patrocínio máster do Corinthians e foi conduzida pelo referido interveniente até a diretoria do clube para o início das negociações. Nunca houve contato com qualquer outra empresa a respeito da negociação para o acordo de patrocínio”, comunicou a empresa, em trecho da nota.
Para dar andamento nas conversas, Alex Cassundé disse aos investigadores que “entrou em contato com Sérgio (Moura), por WhatsApp”, mas que foi avisado pelo líder do departamento de marketing corintiano na ocasião de que ele “iria tirar uns dias de folga”. Segundo Cassundé, Sérgio o orientou a ir ao Parque São Jorge “procurar por Marcelinho, diretor administrativo”.
Cassundé contou que foi recebido por Marcelo Mariano, conhecido por Marcelinho, “dia 20 ou 21 de dezembro” e que notou que o dirigente “não deu tanta credibilidade” a ele, mas, ainda assim, passou o contato do proprietário da VaideBet.
“Mais ou menos no dia 28 ou 29”, segundo Cassundé, “Sérgio (Moura) entrou em contato dizendo que a negociação poderia dar certo”. Cassundé, então, “perguntou se iria ganhar alguma coisa” e, conforme depoimento, Sérgio respondeu “que existia uma comissão de intermediação” e que “o máximo seria de 10%, mas que não seria esta a porcentagem”.
Alex Cassundé também comentou que “por volta do dia 30 de dezembro, Sérgio ligou dizendo que ele tinha de passar o CNPJ para o contrato de intermediação”. Cassundé enviou os dados da Rede Social Media Design LTDA, empresa que ele abriu em 2021, e explicou que “conversou com o contador para que pudesse colocar um Cnae (Classificação Nacional das Atividades Econômicas) de intermediação”.
Cassundé reconheceu que chegou a emitir nota fiscal para receber do clube, mas que nunca cobrou ninguém pelos atrasos no pagamento. Segundo ele, “em 18 de março, percebeu que havia caído R$ 700 mil na conta da empresa e estranhou, pois a nota havia sido emitida no valor de R$ 1,4 milhão”. Cassundé completou ao dizer que “resolveu não entrar em contato, mas, no dia seguinte, caiu outros R$ 700 mil”.
EXPLICAÇÃO SOBRE A NEOWAY
A Polícia Civil de São Paulo também está investigando o repasse de R$ 1 milhão feito pela empresa de Alex Cassundé e citada como intermediária do contrato entre Corinthians e VaideBet a uma empresa “laranja”, a Neoway Soluções Integradas.
Para explicar as transferências, Cassundé disse que “criou um Plano de Saúde Pet” e que buscava comprar ou alugar um “sistema de telemedicina”. Ele procurou por Maurício Manfran, uma pessoa que ele conhecera numa feira e que disse que tinha um sistema pronto.
Na sequência, Cassundé comentou que marcou um encontro com Maurício Manfran em fevereiro, em Alphavile. O acordo foi selado sob o custo de “R$ 1,060 milhão, desde que o pagamento fosse feito à vista”. Manfran, então, passou os dados da Neoway Soluções Integradas e Cassundé explicou que fez as transferências até atingir R$ 1,060 milhão.
Questionado pelos investigadores, Cassundé afirmou que “não tem experiência nos mercados de Pet e Telemedicina”, que não possui ata da reunião com Manfran e que também não fez nenhum pré-contrato antes de depositar mais de R$ 1 milhão na conta da Neoway.
Cassundé relatou à Polícia que Manfran não cumpriu o prazo de 30 dias para a entrega do sistema, mas que não notificou a empresa e encaminhou um contrato por WhatsApp, sem nunca ter obtido retorno. Cassundé disse que “acredita que caiu em um golpe”.
No depoimento, Alex Cassundé explicou que há quatro anos recebe assessoria jurídica de Cláudio A. Salgado, que, inclusive, o acompanhou na delegacia, mas que não informou ao advogado sobre o contrato com a Neoway no momento em que as negociações ocorreram.
Por fim, Cassundé disse que não conhece Edna Oliveira dos Santos, mulher de Peruíbe que aparece como dona da Neoway nos registros do governo. Ele também garantiu à Polícia que desconhece o fato de ter 73 empresas no Ceará com o nome dele, assim como desconhece os 341 depósitos em espécie que recebeu, totalizando R$ 562,650 mil.
SITUAÇÃO DE MOMENTO
A Polícia Civil, com apoio do Gaeco, segue convocando pessoas envolvidas no caso para apurar todos os fatos. Por ora, nenhuma medida foi tomada pelas autoridades. Mesmo assim, a VaideBet optou por rescindir o contrato com o Corinthians no dia 7 de junho.
O clube corre o risco de ter de arcar com a multa de 10% do valor a ser cumprido do contrato, equivalente a R$ 30,4 milhões. Isso porque há uma cláusula no vínculo assinado em janeiro que determina este pagamento pela “parte que der causa à rescisão”.
O Corinthians, por sua vez, entende que não responde por terceiros e contesta a ruptura, cobrando da VaideBet uma suposta dívida avaliada em R$ 6,3 milhões, referente a um saldo contratual. O Timão também não descarta cobrar da empresa de apostas o mesmo valor da multa rescisória, sob alegação de que a “cláusula anticorrupção”, prevista no contrato e citada pela VaideBet, só tem validade após a conclusão de um eventual processo judicial, e não somente devido a investigações.