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Autismo: diagnósticos estão de fato sendo feitos com critério neurocientífico?
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Autismo: diagnósticos estão de fato sendo feitos com critério neurocientífico?

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Tecmundo
20/04/2025 17h00
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Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.

Não é o comportamento que define o cérebro, mas a estrutura e o funcionamento cerebral que moldam o comportamento. Esta inversão lógica, tão comum na prática diagnóstica atual, tem levado a uma epidemia silenciosa de rotulações imprecisas. Em especial, na sobreposição entre os comportamentos típicos do espectro autista e manifestações de síndromes genéticas como a Síndrome de Ehlers-Danlos (SED), essa falha na lógica clínica se torna evidente.

Estamos diante de um problema crescente: diagnosticar autismo a partir de traços superficiais, sem a devida análise das bases neurobiológicas que sustentam tais expressões.

Quando a síndrome afeta o colágeno e compromete a matriz extracelular, esse impacto não se restringe a articulações ou pele. Ele atinge a arquitetura cerebral. E, ao comprometer a estabilidade do meio em que as sinapses se organizam, pode alterar a conectividade entre regiões como córtex pré-frontal, cerebelo, ínsula e amígdala. Não por disfunção do neurodesenvolvimento, mas por uma falha estrutural de base.

Em um caso recente, um paciente adulto foi diagnosticado com autismo apenas após a análise genética revelar uma predisposição à SED. Não havia histórico claro de desenvolvimento atípico na infância. Mas havia fadiga mental constante, hipersensibilidade tátil, dor musculoesquelética e comportamentos repetitivos que, num olhar não aprofundado, poderiam ser lidos como traços do espectro.

O que se viu, no entanto, foi outra coisa: um cérebro funcionando em condição de compensação diante da dor, da instabilidade motora e da sobrecarga sensorial periférica. Um comportamento semelhante ao autismo, mas com origem distinta. Uma fenocópia.

É necessário compreender que a matriz extracelular cerebral tem papel ativo na formação de sinapses, na manutenção da plasticidade sináptica e na modulação da resposta glutamatérgica. Um colágeno comprometido, como ocorre na SED leve, interfere na dinâmica dos astrócitos, na condutância de íons e na integridade das redes neurais.

Isso pode simular, por caminhos distintos, padrões cerebrais semelhantes aos do autismo. Mas a origem é estrutural e não funcional. E isso muda tudo.

O risco aqui não é apenas o erro de nomear errado. É a consequência disso. Quando se chama de autismo o que, na verdade, é expressão de uma síndrome genética, perde-se a chance de tratar a base real da condição. E, mais grave ainda, cria-se um efeito cascata em que o paciente passa a ser adaptado ao diagnóstico, e não compreendido em sua individualidade biológica.

A diferença entre comportamento autista e autismo está na origem cerebral do sintoma. O autismo verdadeiro, aquele que nasce de disfunções do neurodesenvolvimento, tem marcas claras de reorganização neural desde o início da infância. Alterações em regiões como o giro fusiforme, a substância branca subcortical, o hipocampo e as vias do tálamo se expressam de forma consistente ao longo do tempo.

Já a SED leve pode adquirir traços semelhantes de forma tardia, por sobrecarga crônica do sistema nervoso e reatividade a estímulos internos. Não há ali uma falha na construção do cérebro, mas um organismo em permanente estado de alerta sensorial.

É por isso que tantos pacientes diagnosticados com autismo leve, principalmente na vida adulta, acabam se revelando portadores de síndromes pouco visíveis. O diagnóstico precoce baseado apenas em observação comportamental ou apenas testes específicos ou limitados pode capturar sintomas visíveis, mas ignorar mecanismos invisíveis. E a invisibilidade é o lugar onde a ciência mais precisa atuar.

Diagnosticar é nomear uma causa, não apenas classificar um efeito. Quando o que vemos é uma expressão de dor, de disautonomia, de fadiga ou de hipersensibilidade periférica, não podemos chamar isso de autismo. Podemos chamar de sinal. E todo sinal exige investigação.

Por isso, a diferença entre uma síndrome e um transtorno não está nos sintomas que compartilham, mas no cérebro que os gera. E só compreende isso quem olha além da superfície, com a lente da neurociência e o compromisso com a verdade biológica de cada indivíduo.

***

Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues, Pós-PhD em Neurociências, é membro da Society for Neuroscience (EUA), Royal Society of Biology e Medicine (Reino Unido), entre outras. Mestre em Psicologia, licenciado em História e Biologia, tecnólogo em Antropologia e Filosofia. Autor de 300 estudos e 30 livros, membro de sociedades de alto QI como Mensa, Intertel, Triple Nine, IIS e ISI. Professor em PUCRS, UNIFRANZ e Santander, diretor do CPAH e criador do projeto GIP.

Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.
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