Brilho da morte: 34 anos do acidente do Césio 137
Aventuras Na História
Em 13 de setembro de 1987, dois catadores de lixo de Goiânia deram início ao que seria o pior desastre radioativo do mundo desde Chernobyl, em 1986. Ao arrombarem um aparelho radiológico, encontrado nos escombros de um antigo hospital, expuseram o césio 137, pó branco que emitia um estranho brilho azul quando colocado no escuro.
Considerado sobrenatural, o elemento radioativo criado em laboratório passou de mão em mão, contaminando o solo, o ar e centenas de moradores da capital goiana. Foram necessários 16 dias para perceberem que a substância estava adoecendo as pessoas.
Durante esse tempo, a contaminação só se espalhava — e, depois, os trabalhos de descontaminação produziram 13,4 toneladas de lixo radioativo entre roupas, utensílios, plantas, animais, restos de solo e materiais de construção.
Tudo isso foi armazenado em cerca de 1200 caixas, 1900 tambores e 14 contêineres, guardados em um depósito construído na cidade de Abadia de Goiânia, a 24 quilômetros da capital (e lá deve ficar por pelo menos 180 anos).
“O brilho da morte”, como o césio 137 foi chamado por Devair Alves Ferreira, a primeira pessoa a entrar em contato direto com o elemento, fez centenas de vítimas. Quatro morreram cerca de um mês após a exposição. Entre elas, a sobrinha de Devair, Leide das Neves, uma menina de 6 anos considerada a maior fonte humana radioativa do mundo.
Quase uma década depois, o governo passou a pagar pensões vitalícias para as vítimas que, no entanto, reclamam de um descaso do poder público. Em 1996, a Justiça condenou, por homicídio culposo, três sócios e um funcionário do hospital abandonado a três anos e dois meses de prisão. As penas foram trocadas por prestação de serviços.
Confira o trajeto da fatal luz azul:
1. 13 de setembro
Os catadores de lixo Roberto dos Santos e Wagner Mota removem partes de um aparelho usado no tratamento de câncer das antigas dependências do Instituto Goiano de Radioterapia. O objetivo era vender o metal do equipamento para um ferro-velho. Arrombaram a máquina e deram início à contaminação.
2. 18 de setembro
Devair Alves Ferreira, dono de um ferro-velho perto do hospital desativado, compra a peça. No mesmo dia, ele arromba a máquina e entra em contato com 19,26 gramas de césio 137. Ele descobre que a substância, em ambientes escuros, emite uma luz azulada. Encantado, acredita estar diante de algo sobrenatural e leva o pó para casa.
3. 18 a 21 de setembro
Devair recebe a visita de parentes, vizinhos e amigos interessados em ver a misteriosa luz azul. Todos começam a apresentar tonturas, náuseas, vômitos e diarreia — os primeiros sintomas da contaminação radioativa. No dia 19, seu irmão Ivo leva a substância para casa e logo ela se transforma em um brinquedo nas mãos de sua filha de 6 anos, Leide das Neves.
4. 26 de setembro
Odesson Ferreira, outro irmão de Devair, entra em contato com a substância. Motorista de ônibus, contamina centenas de passageiros. Considerado uma alta fonte de contaminação, seu veículo foi destruído como lixo radioativo. Enquanto isso, os hospitais entram em alerta com o número de doentes com os mesmos sintomas.
5. 29 de setembro
Maria Gabriela, esposa de Devair, suspeita que o pó branco seja o responsável pelos sintomas e leva a cápsula de Césio 137 para a Vigilância Sanitária. O físico Walter Mendes é chamado e descobre tratar-se de uma substância radioativa. Ele chega a tempo de impedir que os bombeiros joguem a cápsula dentro do Rio Meio Ponte, principal fonte de abastecimento da cidade.
6. 30 de setembro
Os técnicos da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) chegam a Goiânia e, junto com a polícia militar, começam os trabalhos de descontaminação. Centenas de pessoas que apresentam os sintomas do contato com o Césio 137 são colocadas de quarentena num estádio, onde passam por uma triagem para identificar o grau de contaminação.