Valor histórico e abandono: a curiosa história do castelo de Pedras Altas
Aventuras Na História
“Bem-vindo à mansão que encerra / a dura lida e doce calma / o arado que educa a terra / o livro que amanha a alma”, a frase de autoria de Joaquim Francisco de Assis Brasil apresentava sua fortaleza história a quem chegava no portão.
O político, que nasceu em 1857, fez histórica como parlamentar e diplomata, além de ser uma das figuras mais notórias do Rio Grande do Sul. Em sua vida, participou da criação de partidos políticos, foi governador do Estado, liderou uma revolução e fez ações diplomáticas em Buenos Aires, Portugal e Estados Unidos.
Muito além disso, Assis Brasil ficou eternizado ao inaugurar o castelo de Pedras Altas, em 1912. O político queria viver no campo e, ao mesmo tempo, provar ser possível manter modos sofisticados.
Assim, escolheu uma área rural no sul do estado para construir sua fortaleza de 44 cômodos e acomodar artefatos pessoais de alto valor histórico e financeiro. Embora tenha passado somente duas décadas vivendo por lá, a história do castelo perdura — em meio a crises e conturbações.
Castelo de Pedras Altas
Com arquitetura em estilo medieval e inspirações nos famosos castelos europeus, a fortaleza de Pedras Altas foi construída em pedras de granito rosado, talhadas por canteiros da Espanha.
Entre seus cômodos luxuosos, uma biblioteca com capacidade para guardar 15 mil livros simbolizava o sonho de Assis Brasil em transformar o local em um museu público, permitindo que a população gaúcha tivesse acesso ao conhecimento através de obras importantes dos maiores autores mundiais.
O castelo era sinônimo de força, resistiu a Revolução de 1923, liderada por Assis Brasil, em que apoiadores de Borges de Medeiros travaram uma luta armada com os seguidores de Joaquim. A mansão serviu de abrigo para o diplomata até sua morte, em 1938.
Depois que sua esposa veio a óbito, em 1973, o local foi partilhado entre os herdeiros: os 12 filhos do casal. Nenhum dos filhos está vivo atualmente, fazendo com que a fortaleza seja propriedade de netos e bisnetos. Porém, manter uma área tão ampla, foi motivo de discórdia, crise e abandono.
Abandono e crise
Reconhecido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado e pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o castelo foi tombado como patrimônio público em 1999 — uma tentativa de preservar as memórias.
Mais de um século após a grande inauguração do castelo, a situação vivida hoje é bem distante de seus dias de glória. Vazamentos destruíram mobílias importadas da França e dos Estados Unidos; a umidade deteriorou grande parte do acervo de livros, inclusive uma enciclopédia de Diderot e D’Alambert, como informou o GaúchaZH, em 2019.
Ações de criminosos e arrombamentos também foram frequentes nos últimos anos. Em julho de 2017, bandidos levaram vasos de terracota e um canhão de ferro, depois de vandalizarem a capela onde os residentes originais estão enterrados.
Mais tarde, em fevereiro de 2019, uma ação ainda mais terrível resultou em múltiplos itens roubados, entre eles: medalhas, um relógio, um porta-garrafa feito de prata, uma caixa com tampa de cristal, e uma garrafa de champagne de 1884, com as iniciais de Assis Brasil. O roubo ainda danificou uma espada de marfim dada de presente por um imperador chinês ao político.
As invasões ocorreram depois que Lydia de Assis Brasil, uma das bisnetas de Joaquim, decidiu deixar o local onde morava. Ela havia tentado viver no castelo para preservar seus bens, mas a despesa era mais alta do que ela podia pagar.
Enquanto as tintas das portas e janelas descascam e as grades se deterioram, a família se divide entre crises e a falta de dinheiro para restaurar a fortaleza e reviver o sonho de Assis Brasil.
“A família está unida, interessada em tomar uma atitude positiva pela restauração de Pedras Altas, que está em um estado muito grave. O maior problema é financeiro, por ser muito difícil todos contribuírem. Isso tem nos preocupado”, disse Maria Cecília de Assis Brasil Mendes ao GaúchaZH.
A neta do diplomata insistiu no projeto do museu, mas falta verba. “A ideia veio para prestigiá-lo, porque ele fez parte da história do Rio Grande do Sul. Osvaldo Aranha, Júlio de Castilhos, Borges de Medeiros… Todos têm museus. Por que Assis Brasil não pode ter um também?”.
Uma reunião com todos os herdeiros em 2019, na Secretaria da Cultura do Estado, optou pela venda do imóvel, algo que é extremamente difícil, não só pela condição que a propriedade de encontra, mas pela falta de interessados e localização restrita.
Ainda que o Estado tenha responsabilidade pelo castelo, por ele ser um patrimônio público, não existem fundos para restaurá-lo.
O sonho de Assis Brasil em transformar o castelo em uma propriedade aberta a população jamais foi realizado. Segundo Amarildo Borges, secretário de Planejamento do município: “O castelo é a razão de Pedras Altas existir. Mas se tornou a cidade do castelo que nunca pode ser visitado”.