Trabalho análogo à escravidão: o que acontece nesses casos?
Anamaria
Nos últimos meses, o tema do trabalho análogo à escravidão tem ganhado destaque nas notícias, revelando as condições subumanas enfrentadas por muitos trabalhadores no Brasil. Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), mais de 2,5 mil pessoas foram resgatadas de situações análogas à escravidão em 2022. É alarmante que, em pleno século XXI, ainda existam pessoas vivendo em condições tão desumanas.
Isso levanta questões sobre as diferenças entre os termos “trabalho análogo à escravidão” e “escravidão”. O uso dos termos ajudam a dimensionar a gravidade das situações vividas por essas pessoas, por isso, é importante ter conhecimento sobre eles.
O artigo 149 do Código Penal Brasileiro define o trabalho análogo à escravidão como aquele em que alguém é submetido a trabalhos forçados ou a jornadas exaustivas, em condições degradantes ou com restrição de locomoção devido a dívidas com o empregador.
Por outro lado, a escravidão, embora ainda existam vestígios dela, não é tipificada no Código Penal, pois foi abolida pela Constituição Federal de 1988, que garante uma série de direitos, como:
- Proibição de tortura e tratamento degradante;
- Direito ao salário mínimo;
- Acesso ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS);
- Limite de jornada de trabalho.
O trabalho escravo implica a privação total de direitos, enquanto o trabalho análogo à escravidão inclui situações como o trabalho forçado por dívidas e jornadas exaustivas.
Já o conceito de “escravidão moderna” se refere a relações de trabalho que violam direitos básicos, forçando pessoas a trabalharem contra sua vontade por meio de intimidações como ameaças e violência. Retenção de documentos e cobranças abusivas por moradia também são práticas comuns.
Os setores que mais exploram o trabalho análogo à escravidão no Brasil incluem o agronegócio, a construção civil, a moda e o serviço doméstico, com o agronegócio apresentando um aumento alarmante nos casos nos últimos anos.
O que acontece com quem escraviza?
Os casos atuais não são isolados, mas sim reflexos de um passado escravocrata que o Brasil ainda enfrenta. A Constituição prevê punições severas para quem coloca alguém em situação de trabalho análogo à escravidão, com penas que variam de dois a oito anos de prisão, além de multas e indenizações.
As empresas têm um papel crucial na proteção dos direitos humanos. Os “Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos” servem como guia, incentivando práticas que respeitem esses direitos em toda a cadeia produtiva.
No Brasil, a luta contra o trabalho análogo à escravidão começou com a ratificação da Convenção n° 29 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) em 1957, e o governo tem adotado medidas para combater essa prática, embora não exista uma lei federal específica para disciplinar a questão. O Código Penal já prevê punições para a redução à condição análoga à de escravo.
Diversas iniciativas têm sido implementadas, como a “Força Tarefa de Combate” e a “Lista Suja”, que registra empregadores que mantêm trabalhadores em condições análogas à escravidão. Essa lista é uma ferramenta importante para a fiscalização e pode impactar a reputação das empresas.
O Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, celebrado em 28 de janeiro, por exemplo, é um convite para que empresas reflitam sobre a importância de ações institucionais que respeitem e promovam os direitos humanos, evitando qualquer vínculo com a exploração.
Recentemente, mais de 200 trabalhadores foram resgatados em condições degradantes em uma vinícola em Bento Gonçalves, evidenciando a gravidade do problema. De janeiro a março de 2023, 918 vítimas de trabalho análogo à escravidão foram resgatadas, um número alarmante.
Entre 1995 e 2021, mais de 57 mil pessoas foram encontradas em situações análogas à escravidão em todo o Brasil. A exploração dessa mão de obra tem um impacto econômico significativo, prejudicando não apenas os trabalhadores, mas também as empresas que atuam de forma ética, criando uma concorrência desleal.
A vida após o resgate
O Ministério Público do Trabalho, após o regaste dos trabalhadores escravizados, faz a proteção dessas pessoas. O órgão tem alguns projetos nesse sentido que visam reinserir trabalhadores resgatados em condições dignas.
Um exemplo disso é a parceria com a Universidade Federal da Bahia, que tem como objetivo a criação um assentamento para esses trabalhadores, promovendo uma experiência de trabalho sustentável e respeitando os direitos trabalhistas.
Esse projeto visa atender cerca de 194 trabalhadores resgatados de vinícolas, proporcionando a eles uma nova oportunidade de vida, longe da exploração e com dignidade.
Além disso, é fundamental debater e a agir contra o trabalho análogo à escravidão, para que possamos construir uma sociedade mais justa e igualitária.
Caso suspeite de algum trabalhador em condições análogas à escravidão é possível denunciar pelo Disque 100, serviço gratuito do Governo Federal que funciona 24 horas por dia, 7 dias por semana. Outra forma de contato é pela Central Atendimento Alô Trabalho, do Ministério do Trabalho e Emprego, pelo telefone 158.
Ainda é possível notificar ocorrências pelo e-mail para ouvidoria@mdh.gov.br, ou, utilizando o Sistema Ipê, uma plataforma online do Governo Federal que permite inserir, processar, classificar e acompanhar denúncias.