Alemayehu: O príncipe etíope capturado pelo Exército britânico
Aventuras Na História
Em outubro de 1862, o imperador Tewodros II estava numa situação delicada: grande parte da Etiópia se revoltara contra ele. Envolvido em constantes campanhas militares contra uma ampla gama de oponentes, o imperador também era ameaçado pela invasão do Islã — quando turcos otomanos e egípcios ultrapassaram as fronteiras do país pelo Mar Vermelho e pelo Sudão.
Tewodros II não viu outra opção a não ser enviar cartas para grandes potências clamando por ajuda. À rainha Vitória, o imperador apelou à solidariedade cristã, para combater a expansão islâmica. Mas atraiu pouca simpatia da monarca.
O Império Britânico estava alojado no Nordeste da África e pouco tinha interesse em participar de uma cruzada entre cristãos e islâmicos, ao invés disso, preferiam manter cooperações políticas, estratégicas e comerciais com o Império Otomano, o Egito e o Sudão — uma forma de proteger a rota para a Índia e enfraquecer a Rússia que buscava expansão para a Ásia Central.
Com a falta de respostas, o imperador Tewodros II decidiu agir na força e sequestrou três dúzias de prisioneiros europeus. Em 1868, a Grã-Bretanha enviou uma incursão militar para resgatá-los, através de Maqdala.
Expedição britânica à Abissínia
Liderado pelo marechal Sir Robert Napier, a incursão militar britânica era extravagante, recorda o The Guardian. A missão punitiva contava com 13 mil soldados, 8 mil trabalhadores auxiliares, além de inúmeros seguidores. O episódio ficou conhecido como Expedição Britânica à Abissínia — nome pelo qual o Império Etíope também era chamado.
Por fim, o imperador Tewodros II libertou os prisioneiros ilesos, mas, em seguida, decidiu cometer suicídio ao ter que se render. Mas a missão inglesa não parou por aí. A Etiópia era um mar de riquezas a ser explorado e saqueado.
O Império Britânico retornava à Grã-Bretanha com a maior carga de artefatos roubados da história da Etiópia, descreve o The Guardian. Objetos foram enviados para museus e bibliotecas do país. Mas, a rainha Vitória ganharia algo diferente. Um pupilo.
O príncipe Alemayehu, de apenas sete anos, se tornara órfão após o suicídio do pai, o imperador Tewodros II, e a morte da mãe na viagem da África para a Europa. Ficou sob os cuidados do capitão Tristram Speedy, na Ilha de Wright, no Canal da Mancha.
Alemayehu só foi apresentado para a rainha Vitória quando esteve na Osborne House, casa de verão construída especialmente para ela e para o príncipe Albert. Apesar dos seus constantes apelos para voltar à Etiópia, a monarca decidiu mantê-lo no país.
Ele passou a estudar na escola pública britânica de Rugby, entretanto, não foi feliz, como repercutido pela BBC. Depois, foi para o Royal Military College, em Sandhurst, no entanto, encarou o bullying.
Alemayehu viveu no Reino Unido por quase uma década, quando contraiu pleurisia; morrendo seis semanas depois, em 14 de novembro de 1879. Ele tinha apenas 18 anos.
"Muito triste e chocada ao saber por telegrama que o bom Alemayehu faleceu esta manhã. É muito triste! Sozinho, em um país estranho, sem uma única pessoa ou parente pertencente a ele", escreveu a Rainha Vitória em seu diário. "A vida dele não foi feliz, cheia de dificuldades de todo tipo, e era tão sensível, pensando que as pessoas olhavam para ele por causa de sua cor... Todos lamentam muito".
Com a morte do príncipe, a rainha Vitória providenciou para que Alemayehu fosse enterrado nas catacumbas da Capela de São Jorge no Castelo de Windsor. Seu funeral ocorreu em 21 de novembro de 1879. Uma placa de latão foi colocada em sua lápide com os dizeres: "Quando eu era um estranho, vocês me acolheram".
Pedido ignorado
Em 2007, o presidente etíope Girma Wolde-Giorgis enviou um pedido formal à rainha Elizabeth II para que os restos mortais do príncipe Alemayehu fossem repatriados.
No entanto, todos os pedidos feitos à monarca, ou ao Palácio de Buckingham, foram recebidos com silêncio ou recusados. Uma nova recusa para a devolução dos restos mortais do príncipe Alemayehu para a Etiópia foi oficializada pela coroa britânica na manhã de hoje, 23, conforme repercutiu a equipe do site do Aventuras na História.
Queremos ter seus restos mortais de volta, como família e como etíopes, porque não é o país onde ele nasceu", disse Fasil Minas, um dos descendentes de Alemayehu.
Em comunicado, porém, o Palácio de Buckingham declarou que "o Decano e os Cânones de Windsor são muito sensíveis à necessidade de honrar a memória do príncipe Alemayehu".
Buckingham ainda finaliza a nota acrescentando que é "pouco provável que seja possível exumar os restos mortais sem perturbar o local de descanso" de outras pessoas enterradas em Windsor.