Home
Notícias
Eva Clarke: A menina que nasceu em um campo de concentração
Notícias

Eva Clarke: A menina que nasceu em um campo de concentração

publisherLogo
Aventuras Na História
26/01/2025 21h00
icon_WhatsApp
icon_facebook
icon_email
https://timnews.com.br/system/images/photos/16449029/original/open-uri20250126-18-18ccrrv?1737925692
©U.S. Army Signal Corps
icon_WhatsApp
icon_facebook
icon_email
PUBLICIDADE

Anka Bergman nasceu em Třebechovice, na atual República Tcheca, em 1917. Criada por seus pais e ao lado de dois irmãos, embora fosse judeus, eles não eram uma família religiosa. 

No final da década de 1930, Anka se tornara uma animada estudante de direito que vivia em Praga. "Eu queria companhia, namorados e me divertir. Eu não sabia que Hitler estava chegando, mas eu preenchia meu tempo apenas com cinemas, teatros, shows e festas", disse em entrevista à BBC. 

E foi justamente em uma de suas saídas noturnas que a jovem conheceu seu marido Bernd Nathan, em uma boate. O atraente arquiteto judeu-alemão havia fugido da Alemanha em 1933, quando Hitler se tornou chanceler e a perseguição contra judeus começou. 

Mas em março de 1939, tudo mudou: os nazistas invadiram Praga, mudando a vida de Anka e de Bernd mudou para sempre — e também de Eva Clarke, filha do casal que nasceu em um campo de concentração.

Um novo ser 

Em outubro de 1941, os nazistas começaram a transportar judeus de Praga para Theresienstadt, um gueto e campo de trânsito na cidade tcheca de Terezín. Nathan foi enviado logo no segundo trem, junto de mil outros judeus. Anka o seguiu cerca de quinze dias depois. Eles permaneceram em Theresienstadt, que era um campo de trânsito para Auschwitz, por cerca de três anos. 

Apesar de homens e mulheres ficarem em locais separados, o casal conseguiu manter encontros secretos. Em um desses, Anka engravidou. Mas ser judia e estar grávida era uma grande ofensa ao regime nazista.

"Havia cinco casais na mesma situação e tivemos que assinar um papel dizendo que os bebês, quando nascessem, seriam levados embora", relatou a mulher, ainda à BBC. "Foi a primeira vez que ouvi a palavra 'eutanásia'. Mas nós assinamos".

Foto do casamento de Anka Bergman e Bernd Nathan em maio de 1940 - Domínio Público

Pouco depois, ela deu à luz a um menino. Mas o fruto não foi tirado de suas mãos. Ele morreu ainda no campo, vítima de pneumonia, quando tinha apenas dois meses de idade. 

Passagem por Auschwitz

Ainda em outubro, mas três anos depois, em 1944, Anka engravidou novamente de Nathan. Mas antes que seu marido pudesse saber da novidade, eles foram separados. Bernd seria enviado para Auschwitz.

Apesar de sua amiga estar convencida de que Anka poderia permanecer em Theresienstadt, ela estava determinada a ir atrás de seu amado: "Mas eu quero ir", disse sem saber o que estava prestes a encarar.

Assim, voluntariada, ela partiu em um vagão lotado para um futuro incerto, mas com a esperança de se reunir com a única pessoa capaz de lhe fazer se sentir viva. Ela chegou em Auschwitz no dia seguinte: "Vi as chaminés expelindo fumaça, fogo e o cheiro. E parecia o inferno", recorda. 

"Se minha mãe tivesse chegado ao campo de extermínio de Auschwitz-Birkenau segurando meu irmão nos braços, ela teria sido enviada diretamente para as câmaras de gás", diz Eva Clarke, filha de Anka, à BBC. 

Mas como ela chegou a Auschwitz sem um bebê nos braços e, embora estivesse grávida novamente — dessa vez de mim — ninguém sabia, ela viveu para ver outro dia."

Como Eva diz, ela deve sua vida ao irmão: "A morte dele significou a minha vida, o que é uma coisa muito estranha de se dizer". Anka jamais viu o marido novamente — que fora assassinado a tiros em 18 de janeiro de 1945; dias antes da libertação do campo. 

No principal campo de extermínio da Segunda Guerra, ela teve a sorte de ter um destino diferente. Cerca de dez dias depois de chegar ao local, foi submetida a uma seleção com outras prisioneiras. 

Entrada de trem de Auschwitz - Getty Images

Mas o grupo escolhido não voltou aos dormitórios. A mulher foi levada a um prédio de aparência sinistra, onde tinha certeza que seria assassinada. Em vez disso, recebeu comida para a viagem que estavam prestes a fazer. De lá, as mulheres selecionadas foram embarcadas em vagões de trem de cabras. Então, elas deixaram Auschwitz.

A liberdade

A viagem acabou em Freiburg, na Saxônia, Alemanha, perto da cidade maior de Dresden. Lá, o grupo de mulheres foi conduzido ao topo de uma colina que abrigava uma enorme fábrica de armamentos. 

Entrar na fábrica foi um grande alívio para Anka, pois estava agradavelmente quente lá. No espaço, os prisioneiros tinham beliches para dormir e cada um recebia uma caneca e uma colher, o que, segundo Anka, era "muito civilizado depois de Auschwitz". Entretanto, a comida era escassa e pelos seis meses seguintes ela lentamente passou fome.

Já na parte final da guerra, em abril de 1945, os nazistas passaram a tentar se livrar de todas as testemunhas vivas do Holocausto. Aquela altura, alguns campos já haviam sido libertados, como Auschwitz. 

Sendo assim, Anka e outras mulheres foram enviadas em uma torturante viagem de três semanas de trem. "Estava a céu aberto e era sujo, sem comida e quase sem água", recorda.

Em 29 de abril de 1945, Anka chegou ao campo de extermínio de Mauthausen. Saber o local para o qual havia sido enviada foi um choque profundo, visto que a mulher tinha ouvido falar barbaridades sobre o campo no início da guerra. 

Ela diz que o choque foi tão grande que ela acha que provocou o início do trabalho de parto e ela começou a me dar à luz naquele caminhão de carvão", revela Eva.

A filha de Anka conta que as duas só sobreviveram por duas razões: "A primeira é que, em 28 de abril de 1945, os nazistas desmantelaram a câmara de gás em Mauthausen". Ou seja, se o desembarque tivesse sido feito no dia anterior, provavelmente a mulher grávida teria sido exterminada. 

"E a segunda razão pela qual sobrevivemos foi porque, alguns dias depois do meu nascimento, o exército americano libertou o campo [em 5 de maio]. Minha mãe acha que ela não teria durado muito mais tempo", completou. 

Após a guerra, Anka se casou novamente, em 1948, com Karel Bergman, um tradutor tcheco. Anka faleceu 17 de julho de 2013, aos 96 anos. 

Eva, atualmente com 79 anos, mora em Cambridge. Aposentada, ela é palestrante do Holocaust Educational Trust — combatendo casos modernos de racismo e preconceito por meio do compartilhamento das experiências de sua família no Holocausto. 

Eva Clarke - Imperial War Museums

"Para lembrar de todos aqueles milhares e milhares e milhares de pessoas que morreram, que foram mortas no Holocausto, e especialmente de todos aqueles milhares de pessoas que nunca tiveram uma única pessoa que se lembrasse delas porque todas as suas famílias foram mortas", finaliza.

Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.
icon_WhatsApp
icon_facebook
icon_email
PUBLICIDADE
Confira também