Medalha saqueada durante invasão italiana da Etiópia causa polêmica em leilão
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Aventuras Na História
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O leilão de uma medalha em ouro maciço, a Imperial Order of the Star of Ethiopia, que pertenceu a Ras Desta Damtew, líder do exército etíope durante a Segunda Guerra Ítalo-Etíope, não conseguiu atrair compradores neste mês.
Os descendentes de Damtew, um importante personagem da resistência etíope contra o imperialismo europeu, estão agora empenhados em recuperar o artefato tomado por tropas italianas durante a ocupação do país, informa o The Guardian.
A medalha remonta à era do imperador Haile Selassie e pertenceu à Damtew. O item valioso foi disponibilizado para venda no site LiveAuctioneers pela empresa La Galerie Numismatique.
O valor estimado para o item variava entre €60.000 e €90.000 (aproximadamente £50.000-£74.000), entretanto, não houve lances suficientes para a concretização da venda durante o leilão realizado em 1º de dezembro.
Controvérsia
A história do item é marcada por controvérsias, já que sua origem foi descrita como oriunda do "patrimônio de um soldado italiano que esteve presente na captura de Desta Damtew".
A neta de Damtew, Laly Kassa, expressou indignação ao ver a origem da medalha ser divulgada dessa forma: "Senti raiva ao perceber que estavam reivindicando tão abertamente que tomaram algo de alguém que foi executado", afirmou.
O advogado da família, Chris Marinello, especialista em restituição de arte e fundador da Art Recovery International, está atuando pro bono no caso. Inicialmente, a La Galerie Numismatique rejeitou o pedido de restituição e sugeriu a venda da medalha por €61.595, incluindo taxas adicionais.
Após o fracasso do leilão, o atual proprietário da medalha, um colecionador britânico residente na Espanha, iniciou conversas diretas com os representantes legais da família Damtew. A galeria responsável pela venda não comentou sobre o assunto quando abordada.
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A história
Especialistas destacam que a medalha possui uma importância histórica significativa devido à conexão direta com um suposto crime de guerra. Ras Desta Damtew foi capturado em 24 de fevereiro de 1937 após confrontos perto do Monte Gurage e executado sob ordens de oficiais italianos.
Em 1948, o governo etíope denunciou cidadãos italianos ao Comissariado das Nações Unidas sobre Crimes de Guerra (UNWCC), apontando evidências sobre o assassinato de Damtew enquanto ele era prisioneiro de guerra.
Segundo James De Lorenzi, professor associado de história no John Jay College of Criminal Justice em Nova York, a medalha foi adquirida por um agente do regime fascista diretamente envolvido nesse crime de guerra. "A devolução da medalha à Etiópia é a única escolha responsável considerando sua proveniência", afirmou De Lorenzi ao veículo internacional.
A Imperial Order of the Star of Ethiopia não seria o primeiro artefato precioso retornado à África Oriental nos últimos anos, no entanto, seu caso pode reascender discussões sobre objetos saqueados durante a ocupação italiana entre 1935 e 1941.
O artigo 37 dos tratados de paz de Paris de 1947 estipulava que a Itália deveria restaurar todos os bens culturais etíopes removidos desde 3 de outubro de 1935. Contudo, além do retorno do obelisco Axum em 2005, as instituições e indivíduos italianos têm falhado em cumprir essa exigência.
Ras Desta Damtew pertencia à aristocracia etíope e sua luta contra a ocupação italiana fez dele um ícone da resistência africana ao colonialismo. Sua neta Kassa enfatizou que caso consigam recuperar a medalha, ela não será mantida em posse privada: "Queremos que ela fique em exibição permanente no Museu Nacional da Etiópia em Adis Abeba".
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