O garoto que descobriu que o pai era um espião
Aventuras Na História
"Ele era um pai ausente por um tempo e um pai presente no resto do tempo… Era uma relação muito boa, mas às vezes ele simplesmente não estava lá por razões não explicadas."
É dessa forma que o jornalista e ex-apresentador de rádio da ABC, Mark Colvin, descrevia a relação com seu pai. Entre as décadas de 1950 e 1960, ainda na infância de Mark, ele tinha dificuldades para entender o vínculo afetivo, mas sempre seu genitor como um dedicado diplomata britânico que, por conta de sua profissão, fazia a família viajar pelo mundo.
Apesar do elo forte entre eles, havia algumas questões que ele não entendia sobre o pai, John Colvin, como o fato dele trabalhar durante muitas horas e ficar um tempo considerável longe de casa. John também dava poucas informações sobre seu ofício.
O ar de mistério sobre os detalhes do trabalho de seu pai, fez com que Mark e sua irmã, Zoe, frequentemente brincassem que o patriarca poderia ser um espião disfarçado. E em meados da década de 1970, a família descobriu realmente queJohn era um agente do MI6 — o serviço secreto britânico, informou a BBC.
Vida secreta
Mark Colvin nasceu em 13 de março de 1952, em Londres, na Inglaterra, e desde jovem teve uma vida agitada. Até seus cinco anos, seu pai já havia ocupado posições diplomáticas na Noruega e Áustria. Em 1957, John foi enviado à Malásia com a missão de enfraquecer o imperialismo da União Soviética na região (objetivo esse, é claro, que ele jamais contou para sua família).
Assim, o agente passou a dividir seu tempo entre os cuidados da sua família e o gerenciamento de tropas de contrainsurgência durante a Emergência Malaia — conflito colonial ocorrido na Malásia britânica, entre 1948 e 1960, que colocou frente-a-frente as forças armadas da Commonwealth e o Exército de Libertação Nacional Malaio (ELNM), que era o braço militar do Partido Comunista da Malásia.
Quando fomos viver em Kuala Lumpur, eu acreditava que ele era apenas um diplomata", revelou Mark à BBC.
"Uma vez fui com ele para dentro da selva e inspecionamos uma tropa de combatentes — homens de tribos das montanhas —, mas achei que aquilo fazia parte do trabalho dele. Achei que ele fosse um diplomata colonial. Não percebi que aquilo era parte de seu trabalho na inteligência."
Em paralelo com sua vida familiar, John precisava fazer seu trabalho de espionagem no auge da Guerra Fria; o que trouxe sérias consequências para sua vida pessoal. Por conta do estresse do trabalho, por exemplo, ele acabou se divorciando de sua esposa, Anne Manifold, mãe de Mark.
Além disso, o serviço secreto o acabou lhe distanciando de uma relação mais próxima com os filhos — cada vez mais curiosos sobre o trabalho do pai. Durante a adolescência de Mark, John teve uma nova missão: teria que se apresentar no consulado britânico em Hanoi, então capital do Vietnã do Norte.
Durante esse período, John ficou a milhares de quilômetros de distância de sua família. O agente secreto também correu sérios riscos, como a participação na operação Rolling Thunder — um programa de bombardeio aéreo conduzido contra o Vietnã do Norte feito por Forças Aéreas e Navais dos Estados Unidos e do Vietnã do Sul.
Entre 1971 e 1974, John Colvin se casou novamente e chegou a ser nomeado embaixador de Sua Majestade na Mongólia. Posteriormente, foi chefe de estação do Special Intelligence Service de 1977 a 1980.
Meu pai, um espião
Quando completou 20 anos, MarkColvin já atuava como jornalista na ABC (Australian Broadcasting Corporation). E foi durante essa fase da vida que sua mãe revelou a verdade sobre seu pai: John era um espião do MI6.
Com a descoberta, Mark logo começou a encaixar um quebra-cabeça que antes tinha muitas peças soltas. Como quando o pai sempre lhe advertia para não viajar à União Soviética sem dar nenhuma explicação. Apesar do segredo de décadas, Mark entende que as coisas foram melhores assim.
Após a revelação, Mark chegou a combinar de se encontrar com o pai em Nova York, durante uma série de viagens que faria ao redor do mundo. Após cinco anos sem vê-lo, ele revelou finalmente a verdade.
John confidenciou que sua posição como conselheiro na embaixada britânica em Washington era, na verdade, apenas para disfarçá-lo como chefe do setor do MI6; e que ele tinha como função estabelecer uma ligação entre as agências de inteligência britânicas (Os Amigos) e a CIA (Os Primos).
JohnColvin só se aposentou do serviço de inteligência em 1980, quando passou a trabalhar em um banco em Hong Kong. Além disso, ele também publicou resenhas de livros em jornais britânicos, escreveu suas próprias memórias e é autor de uma série de obras de história militar. John faleceu em 2003. Já Mark foi jornalista e apresentador de rádio e televisão. Ele morreu em 2017, aos 65 anos.