Rainha depois de morta: A trágica história de Inês de Castro e d. Pedro I, rei de Portugal
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A história que você vai conferir aqui é uma das mais românticas e trágicas da Idade Média: o amor de d. Pedro I, rei de Portugal, e de Inês de Castro, a que foi rainha depois de morta. Vale lembrar, entretanto, que o d. Pedro I de Portugal não tem nada a ver com o d. Pedro I do Brasil.
O d. Pedro I desta história é de outra dinastia portuguesa: a de Borgonha, também chamada de Primeira Dinastia. Os membros da família em questão governaram Portugal de 1139 a 1383.
Já o d. Pedro I do Brasil era da dinastia de Bragança e foi o primeiro com esse nome a governar no Brasil, por isso o I do título, no entanto, ele foi o quarto Pedro a governar Portugal.
O d. Pedro que nos interessa para contar esta história nasceu em Coimbra, em 8 de abril de 1320. Ele era filho do infante d. Afonso, herdeiro do trono de Portugal, com sua mulher, Beatriz de Castela. Pedro era o quarto filho e o terceiro menino, mas, os seus dois irmãos mais velhos morreram ainda bebês. Quando nasceu, se tornou o segundo na linha de sucessão do seu avô, o rei d. Dinis. Não se sabe muito sobre a infância de d. Pedro, ou como foi educado, entretanto, há relatos que mostram que, aos 15 anos, ele já morava na sua própria casa, fora da residência dos pais. Existem registros a respeito de sua gagueira na infância e juventude.
Pedro tinha o pavio curto e era dado a ataques de raiva, por outro lado, gostava de festas e música. Também chegou a ser visto com os amigos andando pelas ruas de Lisboa, cantando e dançando com pessoas comuns. Isso quando não estava caçando ou escrevendo poesia: d. Pedro era um trovador. Na idade média, geralmente era um nobre, ou alguém com acesso à educação, que criava composições poéticas e, por vezes, também as cantavam.
Em busca da esposa
Afonso, o pai de d. Pedro, subiu ao trono como D. Afonso IV em 1325, quando o seu filho tinha cinco anos de idade. O rei e a corte logo começaram a se preocupar com o casamento do herdeiro do trono. Tudo foi acertado quatro anos depois, quando d. Pedro tinha nove anos. Ele se casaria com uma princesa do Reino de Castela chamada Dona Branca. Mas, quando os noivos se conheceram, a menina tinha um problema de saúde e d. Pedro se recusou o casório. Como resultado, o rei de Portugal acertou o casamento do seu herdeiro com d. Constança Manuel.
Ela era uma nobre castelhana, neta de um rei de Aragão, e bisneta de um rei de Castela, portanto, tinha sangue real. d. Constança era quatro anos mais velha que Pedro e quando tinha nove anos se casou com o rei Afonso XI de Castela, no entanto, o casamento, como era de se esperar, não se consumou e acabou anulado. Era mais interessante para os castelhanos uma união dinástica com Portugal.
O rei d. Afonso de Castela conseguiu a anulação do seu casamento com a criança e a aprisionou. Em seguida, se casou com uma das filhas mais velhas do rei de Portugal. Assim, o rei de Castela libertou a jovem, que foi negociada pelo pai em casamento com d. Pedro, herdeiro do trono de Portugal. O cenário deixa claro: a mulher era elemento de troca no jogo pelo poder e influência das grandes famílias nobres.
Pedro e d. Constança se casaram em 1339. Ele não ficou nada feliz com o casamento, afinal, queria ter sido pelo menos ouvido antes. Como era de se esperar, o nobre não estava nem um pouco interessado em tentar gostar da esposa. Ele passava a maior parte do tempo num lugar chamado Touguia, hoje Atouguia da Baleia, onde costumava caçar, e só se encontrava com d. Constança para cumprir os deveres conjugais: eles precisavam de filhos para continuar a dinastia. Essa era a finalidade dos casamentos no passado.
'Colo de Garça'
Em uma dessas visitas, d. Pedro reparou numa das várias damas de companhia que d. Constança trouxe com ela de Castelo. A mulher tinha uma longa cabeleira loira, era elegante, com um pescoço comprido e um belo colo, o que lhe valeu o apelido de “Colo de Garça”. Também tinha outro atrativo que as outras damas não contavam: nasceu na Galícia.
Na época, a língua galaico-portuguesa não era bem dividida em galego e português. Além disso, a mãe dela era portuguesa, portanto, falava a mesma língua de d. Pedro desde criança. O seu nome era Inês de Castro. Era a filha ilegítima de um dos fidalgos mais poderosos do reino de Castela. Curiosamente, também foi uma prima distante tanto de d. Constança quanto de d. Pedro, por parte da mãe dele.
Pedro gostou dela, ela gostou dele, e isso ficou tão óbvio que d. Constança percebeu a situação e se desesperou. O marido já não demonstrava tanto interesse, ainda mais se iniciasse um caso com uma das suas damas. Então, ela convidou Inês para ser madrinha de um dos filhos deles, que acabou morrendo poucos dias após o nascimento.
Constança acreditava que os laços sagrados de comadre e compadre, muito importantes na época, fariam os dois pensarem duas vezes antes de iniciar um relacionamento. Entretanto, não deu certo: Pedro e Inês logo começaram um romance. A tradição conta que eles se encontravam escondidos em Coimbra, na Quinta do Pombal ou de Santa Clara, que depois passaria a ser conhecida como Quinta das Lágrimas, uma propriedade da coroa, junto à fonte que levava água para o mosteiro de Santa Clara. Por isso, o local hoje é conhecido como fonte dos Amores. Logo, todos perceberam que os dois estavam apaixonados.
O caso
O rei d. Afonso IV, o pai do Pedro, ficou, como era de se esperar, bem zangado com a relação, mas não tanto pelo romance em si. Ter um caso fora do casamento era mais ou menos aceito na época. O próprio rei tinha, pelo menos, uma filha ilegítima. Mas, em primeiro lugar, fazer isso fora do absoluto segredo seria contra a moralidade da época. Foi essa a desculpa que d. Afonso deu para tentar encerrar o caso do filho. No entanto, havia problemas maiores, que eram de ordem política. Em primeiro lugar, humilhar publicamente d. Constança poderia resultar em problemas com os aliados de Portugal em Castela. Em segundo, d. Pedro se aproximou dos dois irmãos de Inês de Castro, Fernando e Álvaro. Fernando era próximo do herdeiro do trono de Castela, também chamado Pedro, e que, como o herdeiro de Portugal, também não se dava muito bem com o pai. Álvaro foi com Inês até Portugal. Filho mais novo, e ainda por cima ilegítimo, como a irmã, precisou construir sozinho o seu próprio caminho. O rei d. Afonso acreditava que não seria interessante que esses dois rapazes ambiciosos estivessem tão perto do herdeiro do trono português. Ele também teve receio de que isso pudesse afetar a relação com Castela.
Além disso, a corte também não enxergava muito bem a união pelo motivo contrário: acreditavam que Inês e seus irmãos traziam uma influência castelhana muito forte sobre d. Pedro. Em 1344, o rei de Portugal, determinado a afastar Inês de Pedro, ordenou que ela saísse de Portugal. Inês optou pela casa da sua tia, Teresa de Albuquerque, em Castela, mas, perto da fronteira com Portugal.
Essa tia, responsável por sua criação, era casada com Afonso Sanches, senhor de Albuquerque, um filho ilegítimo de d. Dinis, portanto, meio irmão do rei de Portugal. Só que o amor do Pedro e da Inês era forte demais para esses pequenos contratempos. Ela estava perto o bastante para que pudessem trocar cartas apaixonadas e sofrer pelo amor impossível, bem como se esperava de um caso romântico na época dos ideais do trovadorismo. Vale lembrar que o trovadorismo estava no auge e o d. Pedro era um trovador.
Libertação
Enquanto isso, d. Pedro continuava cumprindo seus deveres conjugais com d. Constança. O terceiro filho do casal, d. Fernando, nasceu em outubro de 1345, no entanto, a mãe não se recuperou do parto e morreu menos de um mês depois. A tradição popular diz que ela morreu de coração partido, pois, o marido amava outra mulher. Para d. Pedro, entretanto, a morte dela foi uma libertação. E mesmo contra a vontade do pai, ele mandou buscar a Inês e a instalou numa quinta perto de onde vivia, para poder vê-la sempre. Mais tarde, eles foram para o norte do país e passaram a viver juntos mais ou menos publicamente. Em 1346, nasceu o primeiro dos três filhos que eles teriam.
Afonso teve problemas com o irmão ilegítimo, aquele que criou Inês, que tentou roubar o trono. Acreditava que os filhos de Inês poderiam tentar a mesma coisa contra o herdeiro legítimo, ainda mais com os tios ambiciosos que tinham. Assim, ele resolveu fingir que ignorava esse relacionamento e começou a procurar uma segunda mulher para o filho, afinal, o herdeiro do trono precisaria se casar pelo interesse do estado, não por amor.
Por outro lado, d. Pedro começou a recusar noiva depois de noiva, afirmando que ainda sentia muito a perda de d. Constança e não queria se casar tão cedo. Só que por volta de 1350 iniciaram-se rumores de que ele havia, na verdade, se casado em segredo com Inês de Castro. Duas coisas colaboraram para essa história circular. Em primeiro lugar, Pedro e Inês voltaram para Coimbra e se instalaram no Paço de Santa Clara, no complexo do Mosteiro de Santa Clara a velha, que a rainha Santa Isabel mandou construir e morou quando ficou viúva, legando o local para seus descendentes, que poderiam viver ali com suas famílias legítimas. Além disso, o rei d. Afonso descobriu que o filho solicitou ao papa uma dispensa para se casar com uma parente. D. Pedro era um primo distante da Inês de Castro. Como consequência, foi fácil d. Afonso somar dois mais dois.
Do ponto em diante, o rei já não podia mais fingir que ignorava o romance. Ele resolveu tirar a história a limpo e bolou um plano. Mandou chamar o filho e afirmou que aceitaria seu casamento com Inês. Por outro lado, d. Pedro, que não era tolo, achou estranha essa bondade súbita do pai respondeu que não tinha a menor intenção de se casar com a mulher. Na realidade, d. Pedro se casou em segredo com a Inês por volta de 1353.
A tragédia de Inês
Muitas pessoas da corte começaram a pensar que precisariam tomar atitude que não poderiam mais permitir a influência dos Castros sobre d. Pedro. Eles achavam que os irmãos de Inês poderiam tentar matar o pequeno d. Fernando, o herdeiro legítimo, para fazer de um dos seus filhos o novo herdeiro do trono. Esse argumento convenceu o rei de que era necessário se livrar de Inês. D. Afonso aceitou o plano de três conselheiros, Pero Coelho, Álvaro Gonçalves e Diogo Lopes Pacheco, para que Inês fosse assassinada.
O rei se dirigiu com eles e outros homens para Coimbra e esperou uma oportunidade. A lenda diz que um dia, d. Pedro se preparava para caçar quando um de seus cães avançou em Inês. Para defendê-la, ele matou o cachorro com a espada e o sangue respingou no vestido dela. Os companheiros acharam isso de mau agouro, entretanto, ele dispensou a superstição e foi embora. E foi nesse dia que o rei e seus conselheiros vieram.
Inês estava sozinha com os filhos quando d. Afonso e seus homens entraram na quinta, em 7 de janeiro de 1355. De novo, de acordo com a lenda, ela teria suplicado, mas nem o choro das crianças fez com que os assassinos voltassem atrás, e Inês foi assassinada. Diz a tradição que suas lágrimas formaram uma outra fonte na propriedade, a Fonte das Lágrimas, e que foi o sangue dela que manchou as pedras dessa fonte de vermelho. Essa história foi incluída por Camões no seu “Os Lusíadas”.
"As filhas do Mondego, a morte escura
Longo tempo chorando memoraram
E por memória eterna em fonte pura
As Lágrimas choradas transformaram
O nome lhe puseram que ainda dura
Dos amores de Inês que ali passaram
Vede que fresca fonte rega as flores
Que as Lágrimas são água e o nome amores"
Os Lusíadas, canto III.
Os conspiradores levaram o corpo de Inês para a igreja de Santa Clara ao lado, onde foi enterrado. No entanto, são os desdobramentos da história que eternizaram o casal na História. Para saber o desfecho, confira o vídeo completo abaixo!