Aracy de Carvalho: a brasileira que salvou judeus do nazismo
Mega Curioso
Quando falamos do Holocausto e de todas as barbáries cometidas pelos nazistas, é comum que nos questionemos o porquê de ninguém ter feito algo para evitar tamanha tragédia. A verdade é que muitas pessoas se esforçaram, arriscando a própria vida para tentar salvar desconhecidos. Uma dessas pessoas é uma célebre brasileira: Aracy de Carvalho.
A história dessa mulher é surpreendente e daria um excelente filme, daqueles capazes de arrebatar todos os prêmios, e está sendo contada agora em uma minissérie exibida pela rede Globo. Aqui, no Mega Curioso, você pode conhecer mais a vida e os feitos dessa célebre brasileira.
Aracy de Carvalho: a jovem culta nascida no interior do Paraná
(Fonte: Reprodução/ Arqushoah)
Aracy de Carvalho nasceu na cidade de Rio Negro (PR). Ela era filha de um bem-sucedido empresário luso-brasileiro chamado Amadeu Anselmo de Carvalho e da alemã Sidonie Moebius de Carvalho.
Aracy de Carvalho estudou em colégios paulistanos tradicionais — o que fez dela uma poliglota. Contudo, a educação tradicional dela não a impediu de ter atitudes consideradas modernas — nem sempre bem-vistas pela sociedade.
A jovem se separou de seu primeiro marido, o alemão Johann Eduard Ludwig Tess, após 4 anos de matrimônio. Divorciada, Aracy decidiu se mudar para a Alemanha com o único filho dessa relação.
Aracy de Carvalho desobedeceu a Getúlio Vargas para salvar judeus de Hitler
Aracy e Guimarães Rosa se conheceram em Hamburgo, mas só se casaram anos depois, no Rio de Janeiro. (Fonte: Reprodução)
O ano era 1934. O fato de ela falar vários idiomas abriu portas a Carvalho. Ela foi trabalhar no consulado brasileiro em Hamburgo como chefe da sessão de passaportes. Foi nesse emprego que conheceu o escritor João Guimarães Rosa, com quem manteve uma longa e apaixonada relação. Naquela época, ele era cônsul-adjunto brasileiro em Hamburgo.
Em 1937, Hitler já havia iniciado a perseguição contra os judeus na Alemanha, fazendo muitos deles tentarem fugir do país. O problema é que Getúlio Vargas, que havia dado um golpe de Estado no Brasil, comandava um governo que não tinha o menor interesse em receber os judeus e, até aquele momento, via a Alemanha como possível aliada.
A Circular Secreta n° 1127
Documento secreto proibia judeus de entrarem no Brasil. (Fonte: Reprodução/ Domínio Público)
De forma discreta, o governo de Vargas proibiu a entrada de judeus em nosso país por meio de um documento secreto enviado aos consulados. Funcionários brasileiros escreviam um pequeno “J” no passaporte dos imigrantes judeus, que eram impedidos de ingressar em nosso país. Aqueles que tinham nomes claramente de origem judaica também tinham dificuldades em viajar para o Brasil.
Foi então que Carvalho decidiu que não colocaria o “J” nos passaportes dos judeus. Além disso, ela falsificou esses documentos, dando a essas pessoas o direito de “voltar ao Brasil”. A brasileira montou uma bem-sucedida rede de contatos que conseguiu trazer centenas de judeus para o Brasil, livrando-os do horror do nazismo. Mais do que isso, Carvalho também os ajudava financeiramente, dando joias e dinheiro para eles recomeçarem suas vidas.
O passaporte como salva-vidas
Por ser uma funcionária do consulado brasileiro, Aracy conseguia se proteger da violência alemã. Em um de seus relatos, ela conta que enfrentou um soldado nazista que queria revistar o seu carro. O soldado, temendo ser repreendido por aborrecer uma funcionária diplomática, desistiu. Naquele momento, duas vidas foram salvas: a da brasileira e do homem judeu que ela escondeu dentro do automóvel.
Brasil entra na Guerra, e Aracy de Carvalho é detida
Presidente Vargas com o presidente estadunidense Roosevelt. (Fonte: Reprodução/ picture-alliance/United Archives/WHA)
Em 1942, o Brasil entrou oficialmente na Segunda Guerra Mundial. As relações entre o país e a Alemanha são cortadas, isso coloca a vida dos diplomatas e dos funcionários dos consulados em risco. Eles ficam detidos durante meses.
Depois de uma longa negociação entre ambos os países, eles retornam ao Brasil.
Carvalho foi morar em São Paulo, com o filho e a mãe. Guimarães Rosa foi para Bogotá, onde atuou como segundo-secretário da embaixada. Eles voltaram a viver juntos no Rio de Janeiro em 1944, quando se casaram.
Justas homenagens à brasileira
Selo comemorativo em homenagem à Aracy de Carvalho.
Guimarães Rosa dedicou sua maior obra, Grande Sertão: Veredas, à esposa “Ara”. Contudo, essa não foi a única honra que a brasileira recebeu.
Em 1982, ela foi homenageada como “Justa entre as Nações”, destaque concedido pelo Museu do Holocausto em Israel. Ela é até hoje a única mulher diplomata a receber essa honraria. Ela também foi homenageada pelo Museu do Holocausto em Washington. Contudo, talvez a homenagem mais bonita que ela tenha recebido foi o o apelido dado pelas pessoas salvas por ela: anjo de Hamburgo.
Ela lutou contra a Ditadura Militar
Após a morte de Guimarães Rosa, Carvalho continuou lutando pelas causas que acreditava. Crítica da ditadura que se instalou no Brasil, ela escondeu em sua casa diversos artistas procurados pelo regime, como o cantor Geraldo Vandré.
História da heroína brasileira virou série de TV
Série brasileira contará trajetória de Aracy de Carvalho. (Fonte: Globo/Victor Pollak)
Aracy teve vida intensa e longa. Faleceu aos 102 anos, e sua história está sendo contada na série Passaporte para Liberdade, da TV Globo. A atriz Sophie Charlotte dá vida à protagonista, fazendo que dezenas de milhões de brasileiros conheçam a trajetória dessa figura tão corajosa.