Por que Victor Gruen se arrependeu de ter criado os shoppings?
Mega Curioso
De acordo com uma matéria deste ano na Exame, há 601 shopping centers em operação no Brasil, dos quais 313 estão na região Sudeste do país. Já um levantamento da Statis apontou que, em 2017, havia cerca de 116 mil deles por todo o território dos Estados Unidos. No Reino Unido, o número foi bem menos ambicioso, conforme informou o Databeats, registrando apenas 550 shoppings.
De longe, a China é a que mais se destaca com seus 4.500 shoppings no país, conforme o Statisa de 2019, e com expectativa de abrir mais 7 mil nos próximos 7 anos. O Japão chega perto dos chineses, acumulando 3.200 estabelecimentos até 2019.
É quase inimaginável que, no início do século XXI, esses grandes centros comerciais foram taxados como "fadados ao fracasso e desmonte" diante do súbito crescimento das compras online e o sentimento geral de desilusão com o consumismo. Segundo a CNBC, contrariando o crescimento de algumas regiões, ainda há chances de que os shoppings fechem até 2025.
Um desejo utópico
(Fonte: Los Angeles Conservacy/Reprodução)
Quem torce há décadas para que os shoppings definhem e fechem, mesmo revertendo bilhões para a economia de um país, é o espírito arrependido do arquiteto austríaco Victor Gruen, responsável por inventá-los.
Nascido em 18 de julho de 1903, em Viena, o homem emigrou para os Estados Unidos em meados de 1938 para escapar do domínio dos nazistas no país. Na América, a princípio, ele ajudou a projetar as famosas vitrines de vidro; contudo, à medida que a Segunda Guerra Mundial caminhava para seu desfecho, ele começou a se sentir insatisfeito com os amplos subúrbios que eram construídos para abrigar as famílias dos soldados que retornavam da batalha.
(Fonte: Pinterest/Reprodução)
Pensando em desarticular o padrão de vida em que ninguém se encontrava, Gruen decidiu criar um lugar onde seus vizinhos pudessem conversar, passear e desfrutar um pouco do tempo livre sem ter que ir para o centro da cidade.
O conceito do shopping, antes de qualquer coisa, surgiu como uma praça moderna da cidade, que seria um pátio interno cercado por lojas, mas também escolas, residências e centros médicos. Haveria fontes de água elaboradas, instalações de arte, locais para comer e árvores. Um local perfeito para se reunir, socializar e morar.
No entanto, o governo tinha planos mais ambiciosos para o empreendimento.
Descontrole e frustração
Southdale Center. (Fonte: Business Insider/Reprodução)
Inaugurado em 8 de outubro de 1956, na cidade de Edina (Minnesota, EUA), o Southdale Center foi o primeiro shopping center projetado por Gruen. Na época, ele era exatamente como o arquiteto havia idealizado: cercado pela esperança de que se transformasse em uma comunidade integrada. Para tanto, até os estacionamentos foram instalados longe do empreendimento para encorajar as pessoas a deixarem seus automóveis e caminhar em meio às lojas.
O conceito rapidamente ganhou o gosto do público e do governo, se espalhando por todo o país e pelo mundo, incorporando ideias cada vez mais ambiciosas sobre os espaços, adicionando características que são tão familiares para nós atualmente.
Contudo, para o desgosto do idealista Gruen, nenhum deles se transformou no tipo de comunidade unida que ele havia imaginado. Poucos shoppings integraram os centros comunitários ou as casas que o arquiteto havia planejado, muito embora o crescimento populacional ao redor deles tenha florescido, exatamente como ele imaginara.
(Fonte: TripSavvy/Reprodução)
Então, o maior pesadelo de Gruen se tornou realidade: seu projeto começou a separar as pessoas em vez de unir, bem como ele havia previso no futuro se não decidisse agir para tentar impedir isso. O shopping se tornou um mero centro de comércio que visa o consumo e fazer as pessoas olharem cada vez mais para si mesmas, e não para as outras.
“Muitas vezes sou chamado de 'pai' do shopping”, disse o arquiteto, em 1978, de acordo com o Quartz. “Eu gostaria de aproveitar esta oportunidade para negar a paternidade de uma vez por todas. Eu me recuso a pagar pensão alimentícia para aqueles empreendimentos bastardos. Eles destruíram nossas cidades”.