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Esportes Jesse Owens, a carreira do atleta que triunfou sob a ira de Hitler
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Jesse Owens, a carreira do atleta que triunfou sob a ira de Hitler
Aventuras Na História
23/07/2021 13h00
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10,3 segundos nos 100 metros rasos; 8 metros e 5 centímetros no salto em distância; 20,7 segundos nos 200 metros rasos; e 39,8 segundos na corrida de revezamento 4x100 metros. Foi com esses números que o atleta Jesse Owens triunfou sob os bigodes de Adolf Hitler durante as Olimpíadas de 1936, em Berlim.
O negro dos Estados Unidos subiu ao ponto mais alto do pódio nas provas de 100 metros rasos, salto em distância, 200 metros rasos e corrida de revezamento 4x100 metros, provando para o ditador que a tal supremacia física e intelectual ariana só existia em sua cabeça doentia. Não bastassem as medalhas douradas, ainda estabeleceu recordes mundiais nos 200 metros e no salto em distância.
Tal feito do rapaz de 22 anos era muito para Hitler, que já colocava em prática sua política de extermínio. Atletas, quando não eram assassinados ou forçados a deixar o país, eram relegados por uma política que, a partir de 1933, privilegiou esportistas que representavam o ideal almejado pelo ditador – branco, de ascendência alemã e, se possível, com corpo que remetesse às esculturas clássicas gregas.
Owens / Crédito: Getty Images
Em 1932, aos 19 anos, fracassou ao disputar as seletivas para as Olimpíadas de Los Angeles, mas não esmoreceu. No ano seguinte já se apresentava em outro patamar, tanto que venceu 75 das 79 provas que disputou e quebrou o recorde mundial das 100 jardas. Ofertas de bolsas de estudo surgiram e ele aceitou a da Ohio State University, o que lhe serviu de base para, em 1935, cravar recordes mundiais no salto em distância, 100 jardas, 220 jardas e 220 jardas com barreira, colocando seu nome como um dos inegáveis destaques das Olimpíadas que aconteceriam no ano seguinte.
Racismo
“O êxito de Jesse Owens foi interpretado como um golpe contra a pretensa superioridade ariana”, considera Alfredo Oscar Salun, doutor em história social pela USP, no artigo Esportes e Propaganda Política na Década de 1930 ao falar da medalha de ouro de Owens no salto em distância, modalidade na qual desbancou o alemão Lutz Long, considerado imbatível na modalidade.
Se na Alemanha Owens triunfou sobre a barbárie, quando regressou aos Estados Unidos, porém, nem as quatro medalhas de ouro que carregava no peito foram suficientes para que a lamentável realidade então em voga no país tivesse alguma mudança. Na volta, o atleta desfilou por Nova York, onde foi recebido por chuvas de papeis picados, muitos aplausos e calorosas saudações.
Owens durante salto / Crédito: Arquivos Federais Alemães via Wikimedia Commons
Contudo, ao colocar os pés num suntuoso hotel onde seria homenageado por autoridades, logo foi orientado para que utilizasse o elevador de serviço. Nem toda a glória do mundo seria capaz de solapar o racismo: os elevadores sociais só podiam ser usados pelos brancos, e Owens não seria a exceção.
O atleta aproveitou seu prestígio para levantar algum dinheiro. Passou a participar de corridas festivas, algumas que se aproximavam do bizarro. Em Cuba, por exemplo, ainda no final de 1936, ganhou 2 mil dólares por vencer uma disputa contra cavalos. Também competiu com cães e até mesmo automóveis. Foi expulso da Associação Amadora de Atletismo por tais atividades sob alegação de que aquilo era degradante, mas ele precisava se sustentar, alegava, e aquela era a maneira que encontrou para isso.
Mas não passou a vida fazendo essas apresentações. Também trabalhou em escolas, foi frentista, teve uma lavanderia e atuou como relações-públicas, emprego no qual se deu muito bem. Chegou a ser embaixador do Departamento de Estado e foi ensinar atletismo em países do sudeste asiático.
Apesar de viver em uma nação onde negros possuíam escassos direitos civis, Owens estava longe de ser alguém engajado nas questões raciais. Em 1968, inclusive, criticou publicamente os atletas Tommie Smith e John Carlos pelo gesto político que fizeram nas Olimpíadas do México. Foi somente no final da vida – morreu aos 66 anos em 1980 – que o esportista, ícone de oposição a Hitler, reconheceu que vivia em uma nação também seriamente marcada pelo desrespeito ao ser humano.
“Depois de todas aquelas histórias sobre Hitler e como ele me esnobou, voltei para o meu país, um lugar onde eu não podia sentar na parte da frente de um ônibus. Então, qual era a diferença?” A Alemanha nazista e os Estados Unidos segregacionistas de alguma forma se refletiam.
Panteras Negras
Os atletas Tommie Smith e John Carlos / Crédito: Getty Images
Nas Olimpíadas da Cidade do México, em 1968, dois negros dos Estados Unidos se tornaram símbolo da resistência. Tommie Smith ganhou a medalha de ouro nos 200 metros rasos, enquanto John Carlos ficou em terceiro lugar. Ao subirem no pódio, na hora do hino nacional, baixaram a cabeça e ergueram o braço com o punho cerrado.
O gesto era o sinal dos Panteras Negras, movimento que nascera em 1966 para combater o racismo e lutar pelo empoderamento dos negros no país. A foto de ambos no pódio em tal posição se tornaria uma das imagens mais emblemáticas da história das Olimpíadas.
No entanto, as consequências imediatas não foram boas para os corredores, ao menos no âmbito esportivo. Como o Comitê Olímpico Internacional veta que os atletas realizem gestos políticos nos jogos, Tommie e John acabaram expulsos daquela edição da competição e suas medalhas foram caçadas. Coube à História transformá-los em heróis.
Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.