Crise do chips: planejamento e investimento são chaves para sobreviver
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*Por Pedro Shara // Desde a pandemia, temos testemunhado uma crise de chips crescente no setor de tecnologia da informação, impulsionada por sanções comerciais. Esses eventos têm causado grandes problemas na cadeia de suprimentos, levando as empresas brasileiras a adotarem medidas cautelares para garantir a continuidade das operações. No entanto, essas ações têm um preço, e os reflexos já podem ser sentidos.
A crescente dependência da produção de semicondutores em um mundo cada vez mais digitalizado é inegável. Esses materiais são essenciais para a fabricação de chips e transistores, e sua disponibilidade é fundamental para o funcionamento de diversos setores. Reconhecendo essa importância, ainda no ano passado, o governo dos Estados Unidos aprovou um investimento de US$ 52,7 bilhões em subsídios, para impulsionar a produção e o desenvolvimento de chips.
A dependência dos países asiáticos nessa produção tem sido motivo de preocupação para os Estados Unidos, a ponto de, no início do ano, tornar-se tema de negociação durante a visita do governo brasileiro à Casa Branca. Enquanto os investimentos são feitos para mitigar essa dependência, o mercado atual ainda enfrenta momentos difíceis. A oferta de componentes eletrônicos tem sido afetada pelas paralisações decorrentes da pandemia e pela continuidade da guerra na Ucrânia.
Como CEO da TS Shara, fabricante nacional de nobreaks e estabilizadores, tenho acompanhado de perto os desafios enfrentados pela indústria. Há dois anos, vivenciamos problemas quando a oferta global ficou escassa. Agora, esperamos uma escalada nos preços devido à falta de insumos, especialmente diante da evolução da guerra e das incertezas que ela traz.
Um levantamento do mercado de suprimentos de materiais e tecnologias de dispositivos eletrônicos revela que até 54% do neon usado nas fábricas de chips, um componente crítico para os lasers, vem de duas empresas ucranianas: Ingas e Cryoin. Essas empresas têm enfrentado severas interrupções devido à invasão russa na Ucrânia. A situação geopolítica, com os EUA e a Ucrânia de um lado, e China e Rússia do outro, tem gerado pressões por sanções comerciais, afetando até mesmo os países aliados.
A chamada Lei dos Chips, que possibilitou o investimento norte-americano, condiciona o financiamento a não adesão a qualquer outro negócio relacionado à fabricação ou ao aumento de capacidade de produção de certos semicondutores na China, por um período de 10 anos. Essa disputa geopolítica tem levado a uma queda na receita global de semicondutores, com previsão de uma redução de 11,2% em 2023, de acordo com a consultoria Gartner.
A TS Shara tem buscado garantir a continuidade de suas operações, mesmo diante da crise dos chips. Como não temos uma fábrica de semicondutores no Brasil e cerca de 80% da produção global está concentrada em Taiwan, adotamos medidas para evitar interrupções. Fizemos um provisionamento capaz de garantir um ano de capacidade produtiva, ação que não vem sem riscos.
No médio prazo, já contamos que os investimentos realizados e a competição na indústria resultem em um aumento da oferta de componentes. A China, por exemplo, já está preparando um pacote de US$ 143 bilhões para impulsionar sua indústria de semicondutores. É crucial que não dependamos de um único país ou região para suprir essa demanda, pois a concentração de produção gera dependência e instabilidade nos mercados.
Além dos impactos na indústria de TI, a crise dos chips também se expande para outros mercados, deixando o Brasil como um dos países mais caros para a aquisição de eletrônicos. Com a indústria precisando comprar estoques adiantados para garantir a produção, amplia-se esse cenário. Provisões inevitavelmente refletem nos preços finais dos produtos, impulsionando a inflação e distanciando ainda mais os brasileiros da tecnologia.
Outro setor particularmente impactado pela escassez de chips é a indústria automobilística. A falta de componentes tem levado a interrupções na produção, resultando na diminuição da oferta de veículos. Carros com maior valor agregado e rentabilidade têm sido priorizados, o que não significa que os modelos populares se tornaram mais acessíveis. O preço dos automóveis disparou acima da inflação oficial, e o carro mais barato no Brasil hoje é vendido por R$ 68.890, acumulando um aumento de 137% desde 2017.
Diante desse cenário desafiador, é essencial que a indústria e os governos adotem medidas estratégicas para garantir uma cadeia de suprimentos robusta e diversificada. Investimentos em produção local, parcerias internacionais e incentivos fiscais são algumas saídas que enxergamos para a recuperação desse setor vital na economia global.
Destacadamente, nossa experiência com o planejamento dos insumos para produção tem desempenhado um fator crucial de estabilidade. A indústria de TI desempenha um papel fundamental na sociedade moderna, impulsionando a inovação e o avanço tecnológico. Portanto, já se veem esforços conjuntos e colaborativos para driblar a crise dos chips, com ações que visam a diversificação da produção e a redução da dependência de fornecedores. É um momento que, se levado com urgência e seriedade, pode significar um futuro mais estável e próspero.
*Pedro Shara é CEO da TS Shara, empresa nacional fabricante de nobreaks, inversores e estabilizadores de tensão e protetores de rede inteligente