The Callisto Protocol é visualmente incrível, mas assustadoramente vazio
Tecmundo
Se você, assim como eu, ama jogos de terror e tem um carinho muito grande pela icônica franquia Dead Space, com certeza ficou extremamente animado com o anúncio de The Callisto Protocol no The Game Awards de 2020.
O novo título concebido por Glen Schofield, co-criador do survival horror da falecida Visceral Games, surpreendeu muito desde o início, com gráficos deslumbrantes e cenas horripilantes e recheadas de gore em todos os trailers apresentados.
Com tantos elementos que relembram a série de horror espacial e o envolvimento de Schofield e outros membros da Visceral no projeto, as comparações entre Dead Space e The Callisto Protocol eram inevitáveis, com os fãs gerando grandes expectativas de que o game teria a capacidade de aprender e superar seu antecessor espiritual.
Porém, será que ele realmente fez valer o hype? E pode mesmo levar o título de melhor survival horror de 2022? Confira a seguir nossa análise completa para descobrir!
Ambientado em 2320, a trama gira em torno de Jacob Lee (interpretado por Josh Duhamel dos filmes dos Transformers), um cara comum que trabalha como transportador de cargas e acaba aceitando uma entrega difícil, mas com um pagamento excelente, entre as luas de Júpiter, Europa e Calisto.
Mas obviamente iria dar tudo errado, afinal estamos em um jogo de terror, não é mesmo? A nave do protagonista é invadida pela infame Dani Nakamura (a Kimiko de The Boys) e seus capangas, e em um momento de confronto, a espaçonave acaba perdendo o controle e caindo no território da temida Prisão Ferro Negro.
Após sobreviver a queda apenas para descobrir que seu co-piloto e parceiro morreu, as coisas desandam ainda mais para Jacob, quando seu suposto resgate por um dos guardas acaba se tornando inesperadamente uma ordem de prisão sem motivo algum.
Como um detento de Ferro Negro, o protagonista é forçado a receber um implante atrás de sua cabeça em uma cena agonizante, desmaiando de dor e acordando em sua cela apenas para descobrir que a sorte o abandonou por completo, pois acontecimentos desconhecidos levaram a um surto epidêmico na prisão que transformou quase todos em biófagos, criaturas grotescas parecidas com zumbis.
Desnorteado, Jacob precisa então encontrar uma forma de combater os monstros para sobreviver, fugir de Calisto e de quebra solucionar o mistério no qual foi violentamente jogado.
Para quem está esperando uma trama complexa, recheada de surpresas e algum tipo de reviravolta chocante, infelizmente vai ficar desapontado. O enredo de The Callisto Protocol é um dos mais simples possíveis, sendo basicamente explicado quase no fim do jogo e seguindo a velha fórmula do surto zumbi, já muito explorada em outros survival horrors.
E não me levem a mal, não vejo problemas em seguir esse tema ou um estilo narrativo simples, porém a falta de profundidade dos poucos personagens apresentados impede muito que os jogadores criem alguma espécie de conexão com cada um deles, ou até mesmo sentir uma empatia pelos problemas que estão passando.
O próprio protagonista é extremamente raso, sem uma explicação sequer sobre os motivos que o levaram a aceitar esse serviço perigoso, ou qualquer outra demonstração de sentimentos além do desespero de fugir do local infestado de biófagos.
No fim, a sensação que fica é que os desenvolvedores podiam ter se inspirado mais no próprio Dead Space ou até e outros games como Resident Evil 7, aproveitando o espaço que uma trama simples oferece para encaixar vários toques extremamente tenebrosos e que conseguem invocar um nível real de temor durante todo o gameplay.
Inicialmente, The Callisto Protocol possui foco no combate corpo a corpo, com uma mecânica em que você pode desviar dos inimigos ao segurar o joystick para o lado oposto em que eles estão atacando. Tecnicamente, é algo bem útil quando você está no mano a mano, mas se for emboscado por mais de uma criatura, infelizmente, não vai te ajudar em nada - além de que a câmera vira uma bagunça nesses momentos.
Após um certo nível de progressão, armas de fogo passam a ser disponibilizadas, mas ainda é preciso pensar bem em como irá gastar sua munição. Isso porque por mais que você possa adquirir balas na loja ou achá-las pelos cenários, as animações de recarga e troca de armas são extremamente lentas. Então, em momentos tensos dá para acabar morrendo rapidinho tentando recarregar ou alternar os armamentos - que por sinal são bem comuns apesar da ambientação Sci-Fi do game.
Outra habilidade interessante é um aparato de gravidade que permite restringir os biófagos e arremessá-los para longe ou em elementos do cenário como: serras, hélices e paredes com espinhos. Porém, a bateria dele é consumida rapidamente e demora para recarregar, então é outro item no qual é preciso avaliar muito bem a hora de utilizar.
Embora essas escolhas prometessem dar um grau de dificuldade interessante para as batalhas, na realidade, só causam um nível de frustração que beira o desnecessário, pois a quantidade de bichos é sempre muito grande e quase impossível de lidar apenas com golpes corpo a corpo. E depois de um certo tempo, você aprende que não importa muito ter uma estratégia elaborada, mas sim decorar de forma robótica o posicionamento das criaturas conforme for refazendo as cenas após cada morte.
E pode acreditar, você vai morrer muito, mas muito mesmo, das piores maneiras possíveis: metade do rosto arrancado, pescoço torcido, socado até a morte, empalado e muitas outras formas completamente grotescas. Porém, após ver as cenas tantas vezes sem ter como pulá-las, o que era para trazer um clima agonizante e horrendo, acaba sendo extremamente gratuito, perdendo todo o impacto de terror e apenas parecendo mais um game de ação genérico.
Uma coisa tem que ser dita aqui, The Callisto Protocol é assustadoramente belíssimo. Fica evidente todo o empenho da equipe da Striking Distance para trazer realismo nas texturas, ambientes, reflexos, iluminação. A captura facial é de longe uma das mais bem feitas na indústria de games, com expressões muito verossímeis, e ver o suor escorrendo pelo rosto e nuca dos personagens realmente é a cereja no bolo dos detalhes impecáveis.
Porém, tanta beleza sem algo substancial de fundo é basicamente como abrir uma caixa de presente linda e encontrar um par de meias velhas. A falta de desenvolvimento do mundo, aliada com uma quantidade desnecessária de jumpscares acabam nos dessensibilizando para o horror que os desenvolvedores queriam passar.
Toda vez que Jacob chega em um cenário novo ou está se esgueirando por algum canto, já começamos a esperar o momento que algum inimigo vai surgir e agarrá-lo, então, um recurso que deveria servir para causar pânico, acaba ficando simplesmente previsível.
O maior 'puzzle' do jogo é colocar fusíveis no lugar para abrir portas
A falta de mapa que deveria passar a sensação de desorientação acaba não sendo um grande problema no fim das contas, com as áreas lineares e quase sem puzzles sendo facilmente trafegadas. Por um lado, isso significa menos tempo tentando encontrar seu caminho, porém, também diminui as vantagens de uma exploração profunda, afinal, são poucas áreas não relacionadas com a história, e que não oferecem grandes benefícios para aqueles dispostos a encontrá-las.
Mini boss que é reaproveitado várias vezes
Além disso, os cenários em geral só contam com um ar de local destruído, faltando aqueles elementos a mais que nos fazem sentir um pavor que vai além da necessidade de eliminar as criaturas que vão surgindo pelo caminho, e elas são tantas que começa até a beirar o irritante. De forma surpreendente, The Callisto Protocol conta apenas com um chefão e um mini-boss, que acaba ressurgindo várias vezes e é basicamente uma esponja de balas com golpes mortais.
E se enfrentar as hordas de biófagos sanguinários já não era uma tarefa fácil, as constantes quedas de fps em momentos recheados de inimigos e ao entrar em novos ambientes deixando tudo ainda mais frustrante.
Como se toda a frustração não fosse o bastante, The Callisto Protocol também possui sérios problemas de performance. Além da falta de DLSS para usuários com placa de vídeo Nvidia, o game sofre de constante stuttering utilizando o DirectX12, mesmo com o meu PC tendo uma configuração bem razoável (Ryzen 5 5600X, 32 gb de RAM e uma Geforce RTX 3070).
E apesar de a Striking Distance ter disponibilizado já três patches desde o lançamento, o título ainda continua apresentando quedas graves de fps, o que resultou em várias análises negativas na página do jogo na Steam .
Apesar de todo o hype e de ter botado fé no Glen Schofield devido a sua bagagem com Dead Space, The Callisto Protocol não passa de um rostinho bonito. Para um game que não está nada barato (R$ 249,90 na Steam, de R$ 299,90 a R$349,90 no PlayStation e R$ 349,95 no Xbox), faltou muito conteúdo e talvez uma boa repaginada nas mecânicas de combate.
Por mais que tenha seus momentos divertidos e gráficos belíssimos, seu tempo de jogo é relativamente curto, com nenhum valor real de replay.
Após o lançamento, os desenvolvedores lançaram um patch para tentar corrigir as quedas bruscas de fps e os lags, e enquanto alguns jogadores afirmaram que isso ajudou, muitos que estão jogando no PC ainda estão experimentando problemas.
No geral, visitar Callisto só vale a pena se você tiver muita paciência e adorar lidar com hordas e mais hordas de inimigos violentos com poucos recursos, mas mesmo assim, talvez seja melhor esperar o preço do título dar uma abaixada antes de se lançar nessa jornada que poderia ter sido incrível se tivesse sido concebida de uma forma melhor.
The Callisto Protocol foi gentilmente cedido pela Krafton para a realização desta análise.