Confira a carta em que Machado de Assis chorou a morte da esposa
Aventuras Na História
Dono de um talento único, Machado de Assis entrou para os livros como um dos maiores escritores da literatura brasileira. Nascido em 21 de junho de 1839, no Rio de Janeiro, Joaquim Maria Machado de Assis era filho ex-escravos mulatos alforriados. Eram eles, o pintor Francisco José de Assis e a lavadeira Maria Leopoldina Machado de Assis.
Foi como romancista que Machado acabou eternizado nos livros de História. Entre suas obras mais famosas estão "Dom Casmurro", "Memórias Póstumas de Brás Cubas" e "Quincas Borba", marcados pela crítica sutil à sociedade brasileira da época.
"Dom Casmurro", talvez sua obra mais famosa, é frequentemente estudada nas escolas brasileiras por sua narrativa envolvente. Já "Memórias Póstumas de Brás Cubas" chama atenção de diferentes gerações ao apresentar um narrador defunto, oferecendo uma visão satírica da sociedade.
A esposa
Sobre sua vida íntima, em 1868, o escritor Machado de Assis uniu-se em matrimônio à portuguesa Carolina Augusta Xavier de Novais, irmã do poeta Faustino Xavier de Novais. O casamento, que perdurou por 35 anos, teve um desfecho melancólico com o falecimento de Carolina em 20 de outubro de 1904.
A perda inspirou Machado a compor o célebre soneto "A Carolina", além de expressar sua profunda tristeza em uma carta endereçada ao amigo Joaquim Nabuco, a qual foi documentada no site do Instituto Moreira Salles.
Nessa carta melancólica, Machado desabafa sobre o peso devastador da perda e agradece pela solidariedade do colega. Ele explica que a ausência de Carolina deixou um vazio em sua vida.
Machado ainda compartilha sua realidade solitária, permanecendo na residência marcada por inúmeras lembranças de Carolina. O escritor também se desculpa por não conseguir responder de imediato a outra correspondência de Nabuco.
Confira a carta completa abaixo:
"Rio de Janeiro, 20 de novembro de 1904
Meu caro Nabuco,
Tão longe, em outro meio, chegou-lhe a notícia da minha grande desgraça, e você expressou logo a sua simpatia por um telegrama. A única palavra com que lhe agradeci[1] é a mesma que ora lhe mando, não sabendo outra que possa dizer tudo o que sinto e me acabrunha. Foi-se a melhor parte da minha vida, e aqui estou só no mundo. Note que a solidão não me é enfadonha, antes me é grata, porque é um modo de viver com ela, ouvi-la, assistir aos mil cuidados que essa companheira de 35 anos de casados tinha comigo; mas não há imaginação que não acorde, e a vigília aumenta a falta da pessoa amada. Éramos velhos, e eu contava morrer antes dela, o que seria um grande favor; primeiro porque não acharia a ninguém que melhor me ajudasse a morrer; segundo, porque ela deixa alguns parentes que a consolariam das saudades, e eu não tenho nenhum. Os meus são os amigos, e verdadeiramente são os melhores; mas a vida os dispersa, no espaço, nas preocupações do espírito e na própria carreira que a cada um cabe. Aqui me fico, por ora na mesma casa, no mesmo aposento, com os mesmos adornos seus. Tudo me lembra a minha meiga Carolina. Como estou à beira do eterno aposento, não gastarei muito tempo em recordá-la. Irei vê-la, ela me esperará.
Não posso, meu caro amigo, responder agora à sua carta de 8 de outubro; recebi-a dias depois do falecimento de minha mulher, e você compreende que apenas posso falar deste fundo golpe.
Até outra e breve; então lhe direi o que convém ao assunto daquela carta, que, pelo afeto e sinceridade, chegou à hora dos melhores remédios. Aceite este abraço do triste amigo velho
Machado de Assis"
Este documento histórico é parte da correspondência entre Machado de Assis e Joaquim Nabuco, organizada por Graça Aranha e publicada pela Academia Brasileira de Letras em parceria com a Topbooks no ano de 2003.