O rosto de Zé, o 'gaúcho' ancestral que viveu há 6 mil anos
Aventuras Na História
Na década de 1960, no interior do município de Maquiné, no Rio Grande do Sul, pesquisadores descobriram um esqueleto bastante antigo. Com estudos, perceberam que se tratava da ossada mais antiga já encontrada no estado.
“Ele foi descoberto em um sepultamento entre lajes e teve datação pelo Smithsonian [Institution], em Washington, entre 4 mil e 6 mil anos antes do presente”, explicou Antônio Soares, diretor do Museu Arqueológico do Rio Grande do Sul, em Taquara, ao G1 em 2020.
Os ossos foram preservados pela instituição gaúcha e se tornaram uma atração no museu, que conseguiu coletar informações importantes sobre o indivíduo por meio de muito estudo e investigação.
Os especialistas descobriram, por exemplo, que se tratava de um homem que viveu no Litoral Norte há cerca de seis mil anos e morreu entre os 40 e 50 anos de idade. Eles também notaram que o esqueleto apresentava fraturas na coluna e clavícula.
Esses danos observados no corpo do indivíduo, que recebeu o apelido de Zé, indicaram que ele provavelmente vivia em grupo pelo simples motivo de que não conseguiria sobreviver sozinho.
Segundo a historiadora Carla Renata Gomes, ele “era um caçador, coletor”. “Fabricava seus artefatos com base nas pedras, nos lascamentos. Se encontrou muitas pontas de flechas, o que faz com que se perceba que era um indivíduo que buscava a caça", completou.
Outro aspecto importante sobre o “gaúcho ancestral” Zé é que, segundo os pesquisadores envolvidos nos estudos, ele era indígena, sendo possivelmente uma mistura entre asiático e africano.
Dando rosto ao Zé
O designer Cícero Moraes, especializado em reconstrução facial forense, foi responsável por dar rosto à importante figura histórica, especialmente para o estado do Rio Grande do Sul e sua herança indígena. O resultado do projeto, com a reconstrução facial, foi apresentado em setembro do ano passado.
Com o resgate do esqueleto e fotogrametria, técnica em que dezenas de fotos possibilitam a criação de uma imagem tridimensional do crânio cuja face será recriada, um projeto de computação gráfica foi iniciado pelo especialista, que realizou um trabalho minucioso pelo computador.
Ele explica que “o processo de reconstrução facial inicia a partir do momento em que as fotos do crânio são enviadas a um algoritmo computacional, que faz a digitalização 3D, ou seja, converte essa sequência de fotos em um elemento, em um objeto 3D compatível com o crânio original”.
Depois da criação do crânio em 3D, o designer usou pinos para reconstituir a pele do indivíduo, com os músculos do rosto, processo seguido da aplicação de pigmentação e cabelos.
Conforme afirma Moraes, “o que a gente faz é uma espécie de engenharia reversa. A gente pega um estudo feito em pessoas vivas e projeta isso em um crânio".
A importância da reconstrução de Zé, para Gustavo Wagner, coordenador do curso de arqueologia da Universidade Federal de Pelotas, está na referência à ancestralidade indígena do Rio Grande do Sul.
“O movimento tradicionalista gaúcho nunca negou sua herança indígena, a sua ancestralidade indígena no modo de ser, nos hábitos, na alimentação”, explicou. “Essa relação da cultura material existe. Reconhecer o rosto agora, um rosto de 6 mil anos, faz referência a essa ancestralidade do Rio Grande do Sul", finalizou.
+Saiba mais sobre o trabalho de Cícero Moraes por meio de seu site clicando aqui.