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A emocionante história de Eddy de Wind, sobrevivente de Auschwitz
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A emocionante história de Eddy de Wind, sobrevivente de Auschwitz

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Aventuras Na História
26/01/2023 21h01
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Em agosto de 1944, o Exército Vermelho se aproximava cada vez mais dos campos de concentração. A derrocada alemã era certeira, só uma questão de tempo. Os nazistas, buscando esconder todas as atrocidades que cometeram durante a Segunda Guerra, começaram a debandar e tentaram apagar seus próprios rastros.

Além do Exército do Reich, outros dois milhões de judeus foram obrigados a seguir pelas chamadas Marchas da Morte. A maioria entre eles não sobreviveu. Estavam fracos e doentes.

Um grupo de crianças sobreviventes atrás de uma cerca de arame farpado no campo de concentração nazista de Auschwitz-Birkenau, no sul da Polônia / Crédito: Getty Images


Meses depois, em 27 de janeiro de 1945, há exatos 76 anos, houve a Libertação de Auschwitz. Nos campos poloneses, que eram comandados por alemães nazistas, só sobraram os enfermos. Gravemente feridos e doentes, eles foram deixados à própria sorte, sem muita perspectiva de viverem.

No entanto, em meio à multidão de debilitados e cadáveres, um entre eles apresentava boas condições de saúde. Era o médico judeu Eddy de Wind. No entanto, a história de Eddy com Auschwitz começa dois anos antes dessa narrativa.

Médico judeu

Em 1943, de Wind havia se voluntariado para trabalhar em Westerbork, um campo de trânsito para deportação de judeus, localizado ao leste da Holanda. De lá, saiam internos para os mais diferentes locais, entre eles, Auschwitz e Bergen-Belsen. Haviam dito a Eddy que sua mãe seria isenta da deportação em troca de seu trabalho. Era mentira. Ela já estava em Auschwitz.

Ainda na Holanda, ele conhece a enfermeira judia Friedel. Eles se apaixonam e se casam no campo de Westerbork. Mais tarde, ainda em 1943, eles são separados e encaminhados para Auschwitz. Porém, eles não são mortos assim que se depararam com o local, muito pelo contrário.

Ele vai para o bloco 9, como parte da equipe médica; ela segue para o bloco 10, mesmo local onde são feitos experimentos de esterilização conduzidos por notórios médicos nazistas — o que inclui Josef Mengele e o ginecologista Carl Clauberg.

A união dos dois sobrevive as mais diferentes adversidades que enfrentam nas mãos dos alemães. No entanto, Eddy foi o único entre eles que conseguiu permanecer em Auschwitz. Friedel seguiu com as tropas do Reich para um caminho de incertezas, onde poucos sobreviveram para contar suas histórias.

A ajuda 

Após os nazistas abandonarem os campos, de Wind, que era um médico treinado, queria começar a tratar as pessoas que foram deixadas para trás. Mas sem equipamentos ou remédios, a única diferença que ele poderia fazer era dizer palavras reconfortantes para seus semelhantes.

Mulheres em barracas em Auschwitz, Polônia, Janeiro de 1945 / Crédito Getty Images

Eddy ficou deprimido. Para ele, parecia um castigo permanecer vivo sem conseguir ajudar ninguém. Ele já não tinha mais motivos para viver e se preparava para tirar toda angústia de seu coração.

Foi então que uma jovem gravemente ferida lhe deu o último suspiro. Ela dizia que queria sobreviver para “contar tudo isso, contar sobre isso... convencer as pessoas de que tudo isso era verdade”.

Com isso, Eddy encontrou uma nova motivação. Ele foi para um quartel onde os nazistas mantinham suprimentos. Lá, encontrou um caderno, um cahier que era usado pelos nazistas para fazer a administração de seus prisioneiros; relatar como as pessoas morreram ou quem foi selecionado para as câmaras de gás, entre outras coisas. No caderno da morte, ele escreveu sua história.

Quando os sovietes chegaram, o médico se juntou a eles. Durante o dia ele cuidava dos libertadores russos e dos sobreviventes, à noite, sentado em seu beliche, continuava a relatar tudo que viveu.

Porém, as marcar de Eddy eram muito recentes, suas feridas não haviam cicatrizado. Aliás, elas nunca fecharam por completo. Mas isso não o impediu de publicar a primeira versão de seu livro em uma editora holandesa em 1946.

Entrada do campo de Auschwitz / Crédito: Getty Images

Mas sua história não teve sucesso, os judeus estavam mais preocupados em reconstruir suas vidas e seu país do que reviverem seu passado recente de dor. Pouco tempo depois da publicação, a editora faliu e o livro desapareceu do mercado por um longo período. Mal sabia, mas seu registro era o único escrito por completo dentro de Auschwitz.

Esse ineditismo e a necessidade de reascendermos discussões sobre os motivos que levaram ao extermínio em massa de grupos minoritários fizeram com que a vida de Eddy ganhasse os holofotes outra vez.

Isso porque, décadas depois, sua história ganhou as estantes novamente com o lançamento de Última Parada Auschwitz: Meu Diário de Sobrevivência, que ganhou versões em 25 idiomas, sendo publicado em mais de 100 países, entre eles o Brasil, pela Editora Planeta.

Em entrevista exclusiva ao site Aventuras na História, Melcher de Wind, filho de Eddy — que faleceu em em 1987 —, falou sobre a importâcia dos relatos de seu pai no dia em que a Libertação de Auschwitz completa 76 anos. Confira:

Pós-Guerra

Após todos os infortúnios da Segunda Guerra, Eddy jamais voltou a viver uma vida considerada normal. Para conseguir relatar tudo que sofreu, teve que escrever sua história em terceira pessoa (logo nas primeiras páginas, nos é apresentado Hans — o responsável por narrar os acontecimentos).

Após Auschwitz, de Wind começou a trabalhar como psicanalista, especializado no tratamento de pessoas com graves traumas de Guerra. No entanto, ele descobriu que esses traumas eram tão profundos que nunca poderiam realmente ser curados, nem mesmo falando sobre eles. “Escrever sua história não ajudou meu pai a superar seus traumas. As feridas eram profundas demais”, conta Melcher.

Judeus desembarcando em Auschwitz / Crétido: Getty Images

“Depois que os alemães deixaram Auschwitz, meu pai quis morrer. Todos os sobreviventes tiveram problemas com o que é chamado de ‘culpa do sobrevivente’ [aquele questionamento sobre o porquê eu sobrevivi e todos os outros morreram]. Nos primeiros dias, após a partida dos alemães, meu pai sentiu algo que eu descreveria como ‘inveja da vítima’. Ele tinha ciúmes daqueles que haviam morrido e não precisavam passar pela dor que ele sentia naqueles dias”, explica.

Melcher conta que nunca soube quando ouviu falar de Auschwitz pela primeira vez, já que o assunto sempre foi recorrente em sua casa. “Minha mãe sempre costumava dizer que Auschwitz estava sentado à nossa mesa na cozinha”.

“Ele [Eddy] conversou bastante comigo sobre Auschwitz. Ele fez isso de uma maneira bastante particular: sem olhar para mim quando estava dirigindo o carro, por exemplo”, relata. ”Meu pai disse uma vez que, por mais que as histórias sejam terríveis, as fantasias que as crianças criam em suas cabeças eram sempre piores. Então, ele pensou que, embora fosse difícil e doloroso falar sobre Auschwitz, era algo que ele tinha que fazer”.

Apesar de Eddy dizer, por meio de Hans, que “todo o povo alemão é culpado”, Melcher garante que seu pai nunca foi um homem revoltado e amargo com os germânicos. “Ele sempre via o povo alemão com altamente humanista e tolerante. O período nazista foi uma marca na história alemã”, diz. “Ele me levou para a Alemanha várias vezes, para ensinar a não odiar”.

“Para mim, meu pai era um herói. Não porque ele sobreviveu a Auschwitz. Isso foi, como ele próprio disse, pura sorte. Mas porque ele decidiu começar a ajudar as pessoas imediatamente após a libertação do campo, passou pelo doloroso processo de escrever sua história, ajudou dezenas de pessoas gravemente traumatizadas como terapeuta após a guerra e encontrou o poder de começar uma nova vida com minha mãe. Ser um de seus filhos nem sempre foi fácil; ele era um homem gravemente traumatizado e frequentemente hospitalizado. Mas isso me deixa incrivelmente orgulhoso de ser filho dele”.

Campo de concentração de Auschwitz Deportado durante a libertação do campo de concentração de Auswitchz Birkenau em janeiro de 1945 / Crédito: Getty Images

Melcher enxerga o livro de seu pai como uma homenagem a sua memória. “Você poderia dizer que contar essa história foi a razão de meu pai permanecer vivo. Eu acho que ele ficaria mais do que orgulhoso que sua história finalmente chegue ao mundo”.

“Se queremos que Auschwitz nunca aconteça novamente, é necessário entender como o campo funcionava, como algumas pessoas podiam se tornar horrivelmente sádicas e como as vítimas podiam permanecer vivas. E é exatamente isso que este livro diz”, conclui.


AH: Você já visitou Auschwitz? Como foi ver de perto onde seu pai esteve?

Melcher de Wind: Eu visitei Auschwitz há alguns meses. Eu sempre tive medo de ir lá, mas a publicação do livro me deu um motivo para eu finalmente fazê-lo, junto com um grupo de jornalistas internacionais.

Foto de Melcher de Wind / Crédito: Divulgação Editora Planeta

O acampamento em si não era tão assustador quanto eu sempre tive medo. Agora, lá é um lugar vazio. Acho que o livro de meu pai leva você para o campo, como era durante a guerra, melhor e mais intenso do que uma visita aos restos mortais.


AH: Você costuma se imaginar no lugar dele? Você se pergunta "eu teria sobrevivido?"

MdW: Claro, mas sempre percebo que esses são pensamentos negativos e que é impossível responder a esse tipo de pergunta. E sempre percebo que sobreviver a Auschwitz foi principalmente pura sorte. Os nazistas queriam que todos os judeus morressem. Então, todo mundo que sobreviveu foi um "erro" em seu sistema.


AH: Você diz que as pessoas não estavam prontas ou que não houve interesse do público em geral após a guerra pelo livro. Você acredita que há interesse hoje?

MdW: O interesse em histórias pessoais da guerra é enorme. Eu entendo claramente o porquê. Em todo o mundo, em todas as sociedades, você vê que a intolerância e o ódio se tornam proeminentes.

Capa do livro Última Parada: Auschwitz - Meu Diário de Sobrevivência / Crédito: Divulgação Editora Planeta 

Última Parada: Auschwitz não é apenas um livro bonito, mas também ajuda as pessoas a entenderem melhor o quê a intolerância e o ódio podem causar, mas, também, nos ajuda a entender como a solidariedade, a humanidade, a esperança e o amor podem nos ajudar.


AH: Seu pai se preocuparia com o aumento do populismo de direita nos dias atuais?

MdW: Sim, definitivamente. Ele já estava realmente preocupado com isso nos anos 1980. Ele morreu em 1987, e viu o crescimento da intolerância. O populismo e o ódio o incomodavam muito. Ele viu isso como resultado de injustiça social e desigualdade no mundo.


AH: Como a experiência de seu pai e as histórias que ele contou a você influenciaram sua visão do mundo hoje?

MdW: Isso me fez perceber como somos todos frágeis e que todos temos que ter consciência da intolerância e do ódio. E que é a solidariedade, a humanidade, a esperança e o amor que podem salvar o mundo.


Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.
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