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Anos de Chumbo F.C: Como a Ditadura influenciou o futebol no Brasil?
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Anos de Chumbo F.C: Como a Ditadura influenciou o futebol no Brasil?

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Aventuras Na História
20/12/2022 20h29
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O Golpe Militar de 31 de março de 1964, que depôs o então presidente João Goulart, foi o apito inicial de 21 anos de terror, perseguições e barbáries no Brasil. O relatório final da Comissão Nacional da Verdade, publicado em 10 de dezembro de 2014, apontou que 434 pessoas morreram ou desapareceram durante o período. 

Importante ressaltar, porém, que o número pode ser muito maior, afinal, somente no Vale de Perus, em São Paulo, um cemitério clandestino usado por agentes da opressão, 1.047 ossadas foram encontradas numa vala em setembro de 1990.

Buscando ‘amenizar’ as atrocidades da Ditadura, o governo usou o futebol como uma maneira de manipulação da massa. Fora de campo, os militares ganharam aliados nas diretorias, usaram centros esportivos como palco para torturas e até mesmo perseguiram atletas. 

1. Caio Martins: O ‘campo de concentração’ da Ditadura

A implementação do AI-5, em dezembro de 1968, é vista como um marco na ‘liberação’ da perseguição e torturas de opositores do regime. Mas a Ditadura já cometia barbaridades desde seus primeiros momentos. Com cadeias abarrotadas no Rio de Janeiro, o Estádio Caio Martins, em Niterói, serviu como antro para prisioneiros. 

Oficialmente, 339 prisões aconteceram por lá, mas quem passou pelo Caio Martins aponta que o número era bem maior, na casa dos 1.800.

Não só um palco pra abuso. Mas um palco onde muitas pessoas estiveram confinadas, presas, sofreram abusos físicos e psicológicos, e torturas”, explicou o professor de História Cláudio Márcio Prado em entrevista exclusiva ao Aventuras. 

Além dos maus-tratos e das condições desumanas dos presos, muitos que estiveram pelo Caio Martins apontam suspeitas de envenenamento e até mesmo tentativas de suicídio devido a pressão que era ‘viver’ lá.

Vista interna do estádio Caio Martins em 2015/ Crédito: Zambrone via Wikimedia Commons

Os ocorridos no estádio carioca, mais tarde, também foram exportados para a ditadura de Pinochet, no Chile, que aprisionou mais de 40 mil pessoas no Estádio Nacional de Santiago. Acredita-se que 400 pessoas morreram por lá.

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2. As mudanças estruturais

Durante os chamados anos do ‘milagre econômico brasileiro’, entre 1968 e 1973, o regime investiu no futebol como uma forma de alienação política. Em 1971, por exemplo, houve a criação do Campeonato Brasileiro, quando clubes de todo o país passaram a disputar a competição. 

Em 1979, para se ter uma ideia, a competição contou com 94 equipes. “Onde a ARENA vai mal, mais um time no nacional. Onde a ARENA vai bem, mais um time vai bem”, era a máxima que se dizia na época sobre o modus-operandi da Aliança Renovadora Nacional, partido político da situação. 

O período também ficou marcado pela construção de monumentais estádios, muitos dos quais se tornaram elefantes-brancos. Idealizadores do perfil Copa Além da Copa, Carlos Massari e Aurélio Araújo apontaram, porém, um dos principais legados do período para o futebol. 

Estádios contruídos durante a Ditadura militar brasileira/ Crédito: Domínio Público

“Eu acho que os clubes ainda não têm um um estatuto democrático, muitas vezes, que permitem ao torcedor, ao sócio, participar diretamente da formação dos clubes. Participar diretamente de eleições; participar de estatutos internos. Tudo isso também vem muito de uma forma de se pensar o país de maneira autoritária”, explicou Massari.

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3. A conivência das diretorias

Mas como os clubes lidam com isso? Se podemos dizer, hoje, que o futebol é um reflexo da sociedade, na época não era diferente. Assim como milhares de pessoas participaram da ‘Marcha da Família com Deus pela Liberdade’, contra Jango, os clubes também apoiaram o golpe. 

Um desses maiores aliados, segundo o jornalista Mauro Beting, outro entrevistado pela equipe do site do Aventuras na História, foi o Corinthians, muito em virtude do posicionamento de seu presidente na época: Wadih Helu

Então, assim, o clube, de São Paulo, que oficialmente mais apoiou publicamente foi o Corinthians, em 64, por conta de Wadih Helu”, aponta.

Após a ‘eleição’ de Castelo Branco, por exemplo, Helu publicou um texto, como presidente do clube, dando vivas à Revolução de 64. O corintiano também foi eleito deputado federal pela ARENA, pela primeira vez, em 1966.

Wadih Helu, presdiente do Corinthians/ Crédito: Arquivo Público do Estado de São Paulo

No fim dos anos 1970, além disso, já no governo de Ernesto Geisel, por intermédio do governador Paulo Egydio Martins e do prefeito Olavo Setúbal, o clube recebeu o terreno de Itaquera

Importante ressaltar, porém, que em 1969, a Gaviões da Fiel surgiu em oposição à Wadih Helu. O clube também ficou marcado pela Democracia Corinthiana. Por isso, Mauro salienta: “Não é um clube que é democrático ou ditatorial. É o seu dirigente”.

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4. A censura

Além da conivência dos clubes, os agentes do regime contavam com a intimidação e censura de veículos jornalísticos para que notícias desfavoráveis ao governo não fossem divulgadas. 

Entre as décadas de 1970 e 1980, por exemplo, o sertão nordestino enfrentou o auge da seca no século 20, quando 3,5 milhões de pessoas morreram de fome e enfermidades ligadas à desnutrição — grande parte delas crianças. 

Retirantes, de Candido Portinari (1944)/ Crédito: Divulgação/ MASP

Jornalista da Rede Globo por mais de quatro décadas, o repórter Chico José revelou ao Aventuras que agentes censuradores ficavam nas redações jornalísticas e o impedia de falar certas palavras em suas matérias: “A gente sabia que uma das palavras proibidas era ‘fome’”.

Eu não podia falar em fome no lugar onde as pessoas morriam de fome”, revelou. 

Além das restrições do cotidiano, Chico também chegou a sofrer com a censura por conta de uma matéria relacionada ao rei Pelé. “Quando eu voltei pro Brasil, e essa matéria saiu, a direção do jornal me chamou e disse: ‘Vai pra casa. Os censores estão aqui te procurando!’.”

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5. A perseguição contra jogadores

Engana-se quem pensa que a Ditadura perseguiu apenas civis ou manifestantes. Professores, artistas, músicos, escritores e até mesmo jogadores de futebol foram alvos do regime militar.

O caso mais emblemático entre eles é o de Nando Coimbra. O sobrenome já denuncia, Nando é irmão de Arthur Antunes Coimbra, mais conhecido como Zico — o maior ídolo da história do Flamengo. 

Além de jogador, Nando Coimbra, enquanto jogador de base, também fez o curso para trabalhar no Plano Nacional de Alfabetização (PNA), idealizado pelo professor Paulo Freire, recorda o jornalista Hélcio Herbert Neto ao Aventuras. 

Fotografia de Nando Coimbra/ Crédito: Divulgação/ Arquivo Pessoal

“O Nando foi uma figura que se manteve de esquerda por toda a vida”, afirma, ressaltando que o irmão de Zico nunca foi ligado às grandes vanguardas populares, como eram chamados os movimentos de luta armada. 

Ele não dessas figuras. Mesmo assim ele foi perseguido. Mesmo assim ele foi torturado e mesmo assim ele foi deixado de lado pelo futebol”, completa.
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Cláudio Márcio Prado, Carlos Massari, Aurélio Araújo, Mauro Beting, Chico José Hélcio Herbert Neto foram as fontes entrevistadas pela equipe do Aventuras na História, em parceria com o portal SportBuzz, em uma série especial de podcasts que ligam a História do Brasil e do futebol. As entrevistas, na íntegra, também já estão disponíveis nos canais do YouTube do Aventuras na História do SportBuzz.

Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.
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