O hino do Rio Grande do Sul é racista?
Aventuras Na História
No início desta semana, a primeira deputada negra eleita pelo Rio Grande do Sul, Laura Sito (PT-RS), protagonizou uma cena pouco usual na Assembleia Legislativa gaúcha durante sua cerimôia de diplomação para o cargo estadual. Quando o hino gaúcho se inicia, ao contrário dos colegas que se levantam, ela permanece sentada, sem cantar.
Laura fez questão de se abster da cantoria justamente em um trecho da composição que gera discussão sobre o cunho da colocação: “Mas não basta pra ser livre / Ser forte, aguerrido e bravo / Povo que não tem virtude / Acaba por ser escravo”.
Dois outros futuros parlamentares se uniram no protesto, sendo eles Matheus Gomes (PT) e Bruna Rodrigues (PCdoB), e sentaram-se durante a execução da música. De acordo com o jornal O Globo, o hino foi adotado na década de 1930 e já está na terceira versão, sendo composto no final do século anterior pelo militar e poeta Francisco Pinto de Fontoura.
Na ocasião em que foi eleito o hino do estado oficialmente pelo Instituto Histórico e Geográfico, celebrava-se o centenário da Revolução Farroupilha, movimento republicano que confrontou o Brasil Império, mas também ficou tragicamente marcado pelo Massacre dos Porongos, quando mais de cem soldados negros, cooptados da escravidão, foram obrigados a fazer frente contra tropas do Império, sendo cruelmente assassinados.
O hino é racista?
Na verdade, não existe uma resposta certeira sobre a construção lírica de a canção ser de origem racista ou não, mas trata-se de uma questão de interpretação devido as colocações em que a composição impõe como significado de bravura.
Ao enaltecer que "povo que não tem virtude acaba por ser escravo", o trecho pode proporcionar duas compreensões; a primeira, levando em conta a bravura de seu povo, direciona a mensagem a escravidão de idealismos, compreendendo que quem não tem virtude pode ser escravo de quem o domina culturalmente.
A segunda, no entanto, diminui a luta histórica contra o racismo e escravidão ao associar a prática à ausência de virtude daqueles que tiveram as vidas cerceadas a serventia. Dessa forma, desagrada aqueles que enaltecem a luta pelo surgimento histórico de figuras escravizadas, que não tiveram escapatória ao correrem riscos de vida e agressões que perduraram por séculos.
Tal fato foi justificado por Laura em entrevista ao portal de notícias UOL, enaltecendo que o verso dialoga com a desumanização das pessoas escravizadas: "Infelizmente, o hino do nosso estado mantém essa estrofe que dialoga com uma ideia que justifica a desumanização das pessoas escravizadas no Brasil, que eram negras".