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O livro que fez Monteiro Lobato quebrar a cara ao tentar conquistar os EUA
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O livro que fez Monteiro Lobato quebrar a cara ao tentar conquistar os EUA

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Aventuras Na História
26/02/2023 12h00
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Um nome muito relevante dentro do sistema de ensino brasileiro, e que fez parte da infância de muita gente, é o de Monteiro Lobato. Nascido na cidade de Taubaté, interior de São Paulo, no dia 18 de abril de 1882, ele foi o responsável por fazer a cidade se tornar conhecida como 'a capital da literatura infantil', sendo assim um dos maiores autores nacionais.

Hoje, embora as obras de Monteiro Lobato sejam amplamente estudadas, e o Sítio do Pica-Pau Amarelo ser parte da identidade cultural do que é ser brasileiro, muito se discute sobre a real necessidade de se manter seus livros como parte da grade curricular padrão do ensino brasileiro, especialmente por um motivo pelo qual o autor é bastante conhecido: o racismo constante em suas páginas.

Um dos exemplos mais recorrentes, e mais conhecidos, é a personagem da Tia Nastácia, aquela que deu origem à boneca de pano mais famosa da literatura nacional, a Emília, que serve como empregada doméstica no Sítio. Uma mulher negra e que representa os saberes populares — afinal, o que teria aprendido seria a partir de sua vivência, e não em instituições de ensino formal —, quase sempre que é mencionada nas obras é referida a cor de sua pele, negra, sem contar a atribuição de características físicas notoriamente distintivas, como se o que a definisse fosse sua cor.

No entanto, o "Lobatoverso" não se limitava às variadas histórias da turminha do Sítio, tendo o taubateano produzido também outras obras até mesmo direcionadas a públicos mais adultos. E, na segunda metade da década de 1920, o escritor tentou emplacar fama internacional nos Estados Unidos com um desses livros, o romance 'O Presidente Negro', mas nenhuma editora lhe deu a chance de publicar o livro em território norte-americano.

Monteiro Lobato
Monteiro Lobato / Crédito: Domínio Público via Wikimedia Commons

'O Presidente Negro'

Com um enredo fortemente racista, 'O Presidente Negro' não teve grande aceitação entre editores norte-americanos, o que fez com que um dos maiores escritores brasileiros se sentisse péssimo, afinal, como poderia não emplacar uma obra em terras anglófonas?

Porém, Lobato não entendia de fato qual era o real problema em questão, no seu livro. Carregando consigo ideologias de um racismo estrutural de um passado escravocrata no Brasil, ele não compreendia por que seus termos e atribuições a personagens negros eram ruins. Nos Estados Unidos, país em que a escravidão já havia sido abolida e a integração de negros na sociedade ainda era um desafio, uma obra como aquela não conseguiria ter espaço.

Lobato se via como um novo H. G. Wells, mas os temas centrais (a segregação completa entre brancos e negros, a tentativa dos brancos de esterilizarem os negros e a influência da eugenia, sugerindo que os brancos fossem superiores aos negros) eram sensíveis demais para qualquer editora norte-americana se arriscar", escreve o escritor e tradutor britânico John Milton no livro 'Um País se Faz com Tradutores e Traduções: A Importância da Tradução e da Adaptação na Obra de Monteiro Lobato', conforme repercutido pela BBC.
Livro 'O Presidente Negro', de Monteiro Lobato
Livro 'O Presidente Negro', de Monteiro Lobato / Crédito: Reprodução/Amazon

Como apontado pelo g1, o livro se inicia no Brasil na década de 1920, onde o personagem Ayrton sofre um fatídico acidente, que o leva a ser resgatado por um cientista excêntrico que, eventualmente, lhe apresenta algumas de suas invenções. Entre elas, está o porviroscópio, uma máquina que mostra o futuro.

Dessa forma, os dois personagens começam a acompanhar a vida nos Estados Unidos, mas curiosamente no ano de 2228, que passava por uma campanha eleitoral. Na história, a sociedade estadunidense era uma espécie de utopia, muito disso devido a algumas medidas tomadas, como o fim da imigração, execução de recém-nascidos com malformações e esterilização de "doentes mentais."

E é em uma sociedade como essa que o candidato à presidência Jim Roy vence, um homem negro — mal imaginava Lobato que o primeiro presidente negro dos Estados Unidos surgiria bem antes, ainda em 2009, com Barack Obama —, o que é qualificado como "o único erro inicial contido naquela feliz composição". 

O livro ainda aponta que a nação estadunidense contava com uma sorte que o Brasil não teve: ao contrário daqui, lá não teria acontecido a miscigenação, que teria causado uma "degeneração" desnecessária naquele mundo.

Por fim, em dado momento, devido a conflitos na convivência dificultada, os negros sugerem a divisão do país; os brancos, porém, dão um passo além: sugerem extraditar a todos para o Amazonas.

Rejeição

Entre aqueles que rejeitaram a ideia de Monteiro Lobato, estava o editor da agência literária Palmer, de Hollywood, onde sacramentou sua frustração, alegando que "o enredo central se baseia em uma questão particularmente difícil de ser abordada neste país, porque certamente resultará no tipo mais amargo de sectarismo".

E, por esse motivo, os editores são invariavelmente avessos à ideia de apresentá-lo ao público leitor", acrescenta. "Nem mesmo o fato de estar ambientado 300 anos no futuro mitigaria esse fato na mente dos leitores negros."

Por fim, o editor ainda alertou Monteiro Lobato de que "os negros são cidadãos americanos, parte integrante da vida nacional", e por isso promover seu extermínio "por meio da sabedoria e habilidade da raça branca" seria apenas uma espécie de divisão violenta.

Apesar do alerta, parece que o brasileiro não refletiu. Em uma carta enviada a um amigo, o escritor e seu correspondente Godofredo Rangel, Lobato reclamou que 'O Presidente Negro' não fora aceito, pois "acham-no ofensivo à dignidade americana". "Errei vindo cá tão tarde", escreve, ainda. "Devia ter vindo no tempo em que linchavam os negros."

Fotografia antiga de Monteiro Lobato mais jovem
Fotografia antiga de Monteiro Lobato mais jovem / Crédito: Domínio Público via Wikimedia Commons
Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.
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