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Por que dizer 'todas as vidas importam' não é correto?
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Por que dizer 'todas as vidas importam' não é correto?

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Mega Curioso
05/10/2021 11h00
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Entre junho e julho de 2020, o movimento Black Lives Matter ("vidas negras importam" em português) surgiu nos EUA e se espalhou por vários países como uma reação à brutalidade policial e ao racismo sistêmico praticado contra a comunidade negra . Porém, não demorou muito para que uma espécie de "contra-slogan", All Lives Matter ("todas as vidas importam" em português), surgisse. A partir de então, quase sempre que a primeira expressão é usada, a segunda é citada para contradizê-la.

Mas será que isso faz sentido?

Utopia versus realidade

Dizer "todas as vidas importam" seria o ideal, mas isso não passa de uma utopia, ao menos por enquanto. Quando evidências empíricas demonstram justamente oposto, ou seja, que há um abismo entre brancos e negros em termos de condições de vida e oportunidades, essa expressão — ou a ideia que ela pretende passar — perde completamente o sentido.

(Fonte: Antrell McLean / Pexels/Reprodução)(Fonte: Antrell McLean / Pexels/Reprodução)

As disparidades raciais e suas consequências negativas não se resumem apenas à violência policial: estão presentes em praticamente todos os setores da sociedade . Nos EUA, segundo o Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC), a taxa de mortalidade entre as mães negras é quatro vezes maior que a de mães brancas. Até mesmo os bebês negros têm o dobro da taxa de mortalidade de bebês brancos.

Isso significa que, entre outros fatores, até os preconceitos que muitos médicos carregam acabam afetando negativamente a qualidade do atendimento prestado à comunidade negra. Em 2016, Kelly Hoffman, cientista comportamental da Universidade da Virgínia, conduziu uma pesquisa sobre falsas crenças em relação aos corpos negros na comunidade médica dos EUA.

Segundo a pesquisa de Hoffman, quase metade dos estudantes brancos de medicina, nos anos iniciais da faculdade, acreditava em coisas como: “negros têm a pele mais grossa, sentem menos dor ou o sangue de pessoas negras coagula mais rapidamente do que o de pessoas brancas”.

E tem mais: quanto mais se acreditava nessas falsas crenças sobre as pessoas negras, maior era o preconceito racial envolvido nas recomendações médicas para o tratamento da dor.

Conforme o estudo, o preconceito que embasava a decisão de um médico em optar por tratar a dor de menor intensidade e mais simples de um paciente branco com mais agilidade, deixando em segundo plano o paciente negro em estado mais grave e com mais dor, estava enraizado em duas bases nem um pouco científicas ou lógicas: na crença que as pessoas negras são naturalmente mais resistentes e resistem melhor à dor e ao sofrimento exatamente por terem uma “vida mais dura”.

As diferenças baseadas em preconceitos acabam fazendo com que negros tenham menos educação e menos oportunidades de crescimento profissional. No ano passado, um estudo da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) apontou que trabalhadores negros ganham 17% a menos que trabalhadores brancos — isso quando são da mesma categoria social!

Escondendo o problema

Dizer "todas as vidas importam" seria como dizer "todas as casas importam" quando é a casa do seu vizinho que está pegando fogo. Ou, então, chegar em uma arrecadação beneficente para combate o HIV e criticá-la dizendo: "existem outras doenças também". Quem sabe um "todas as florestas importam" quando é a nossa Amazônia que está sendo desmatada em ritmo acelerado?

(Fonte: Life Matters/ Pexels/Reprodução)(Fonte: Life Matters/ Pexels/Reprodução)

No contexto de racismo sistêmico , ao dizer "todas as vidas importam" tira-se o foco do ponto central: reconhecer que existem certas questões com as quais pessoas brancas historicamente não têm que lidar e não enfrentam devido à cor de sua pele.

Por fim, também é um problema de interpretação, afinal, não se pretende dizer que as vidas das pessoas negras são mais importantes do que quaisquer outras vidas, mas, sim, chamar atenção para o fato de que, apenas por serem negras, a vida dessas pessoas é desvalorizada. 

O preconceito racial continua a existir mesmo quando já não é mais consciente. E quem diz isso, novamente, são os dados. O conceito base do "todas as vidas importam" também é visto, com algumas variações, em outras situações envolvendo minorias ou grupos de alguma forma menos privilegiados, como indígenas, mulheres e o público LGBTQIA+. E isso é muito complexo, pois existe sempre o risco de se esconder ou silenciar o problema em vez de se enfrentá-lo.

Leia a matéria original aqui.

Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.
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