CPS Changer: o raríssimo e fracassado console da Capcom (especial)
Tecmundo
De Resident Evil 4 até Street Fighter 6, a Capcom vem lançando diversos jogos de sucesso e tendo anos seguidos de crescimento financeiro, figurando entre as 10 maiores empresas de games do mundo. Porém, nem sempre foi assim: a empresa por trás de Street Fighter já teve fases ruins. Bem ruins.
Muitos lembram de DLCs em disco, jogos questionáveis e até final de jogo tendo que ser pago a parte, mas, há cerca de 30 anos, a Capcom tomou uma das decisões mais polêmicas de sua história, a qual ela tentou fingir que nunca aconteceu e que foi uma espécie de delírio coletivo.
No especial do Voxel de hoje, conheça a história bizarra do console da Capcom, desde sua concepção desesperada até o seu fracasso, praticamente jogado para debaixo do tapete da indústria dos games.
Após a crise dos videogames em 1983, o mercado ficou dividido entre os consoles e os arcades, e uma das empresas que melhor investiu nisso nos anos 80 foi a Capcom. A companhia lançava um jogo de sucesso atrás do outro, mas para cada um deles, uma placa gigante de circuitos com componentes diferentes tinha que ser construída, as chamadas PCB.
Isso atrapalhava muito na produção dos games, além de ser um incômodo grande para o dono do fliperama na hora de trocar ou consertar a máquina. Foi por isso que a Capcom, em 1986, teve a ideia de copiar o Nintendinho e criar um sistema único, com especificações técnicas robustas e fixas, como um computador, para que os novos jogos fossem feitos para essa placa ao invés de uma nova placa ser feita para cada novo jogo.
Em 1988, nasce o Capcom Power System, ou CPS-1, o fliperama da Capcom.
Placa da CPS-1
O sistema se tornou um sucesso, trazendo jogos incríveis como Ghouls'n Ghosts, Final Fight, Strider, Captain Commando e claro, o mais famoso de todos: Street Fighter 2. O problema é que, com o sucesso, vieram os problemas.
Em uma última tentativa de vender alguma coisa antes de encerrar o suporte ao CPS Changer, a Capcom anunciou um último jogo para ele como um agradecimento aos fãs, algo especial feito com carinho pois os clientes merecem: o recém-lançado para CPS-2 Street Fighter Alpha seria disponibilizado para a plataforma baseada na placa inferior. Pelo menos foi o que ela disse ao público em pronunciamento oficial na época, mas nos bastidores a realidade talvez fosse um pouco diferente.
“Com o CPS2 aparecendo em todos os lugares, também nos pediram para criar algo no CPS1 para ajudar a acabar com o estoque disponível que tínhamos. (...) Sempre tínhamos no estoque”, explicou o designer do jogo Hideaki Itsuno, sobre a criação de Street Fighter Alpha, em entrevista à própria Capcom em Junho de 2016, basicamente contradizendo aquela entrevista da empresa para a Game Machine. Só que a criação do game para aquele sistema tão defasado não foi nada fácil.
“Street Fighter Alpha foi desenvolvido para CPS2, uma placa-mãe de arcade muito poderosa. (...) A empresa decidiu que o jogo deveria estar disponível para CPS1 assim como para CPS2. Recebi ordens para portar todas as músicas de volta para o CPS1 em no máximo três semanas. Pensando nisso agora, mesmo naquela época a Capcom era muito boa em espremer as pessoas até a última gota de sangue para fazerem um trabalho", reclamou ex designer de som Yoshinori Ono do jogo em entrevista à Eurogamer.
Segundo a própria Capcom, a CPS-2 tinha a potência de 10 placas CPS-1, com isso a versão para CPS Changer que seria uma homenagem, feita às pressas e usando apenas 10% de seu poder, ficou linda no visual, mas tecnicamente muito limitada, cheio de problemas, faltando animações, sons e principalmente... sendo muito cara! A Capcom cobrou cerca de 300 dólares pelo jogo no lançamento, um valor mais caro que o console inteiro com uma fita junto naquele momento!
Ao que parece, a Capcom queria repassar o custo da produção da versão para os jogadores, por isso fez o anúncio como se fosse algo especial e cobrou esse valor. No fim, por mais que visualmente agradasse, a fita de Street Fighter Alpha tinha tantos problemas que usaram ela como base para conseguir desbloquear os sistemas de segurança da Capcom e aumentar a pirataria dos produtos da empresa.
Para NFG Wright, mesmo com vendas abaixo do esperado, o CPS Changer foi um dos frutos de um período muito experimental no Japão, quando várias marcas lançavam produtos inusitados impulsionados pelo crescimento financeiro, tecnológico e populacional que vivia, e no meio disso, a Capcom lançou o seu: "A bolha japonesa tinha acabado de estourar e as empresas japonesas ainda estavam cheias de dinheiro e então, nenhuma ideia maluca era realmente muito maluca. Lembremos do sistema de computador Sharp X68000, do Nissan Skyline R32, do Sony Minidisc e assim por diante", como argumentou o colecionador pra Nintendo Life.
Valor apenas da fita de Street Fighter Alpha para CPS Changer.
Com esse fracasso gigantesco e a Capcom simplesmente fingindo que nada disso aconteceu, o console feito de peças velhas e usadas na vida desapareceu de seus comunicados oficiais e foi caindo no esquecimento globalmente. Assim, poucas cópias dos jogos e do CPS Changer são encontradas hoje, se transformando em um dos consoles mais raros do mundo, segundo o Video Game Console Library.
Devido a essa situação peculiar e sua raridade, o produto da Capcom é vendido muito rapidamente quando aparece nas lojas de usados, custando valores estratosféricos que poderiam dar entrada na compra de um carro novo. É impressionante como o lixo vendido por uns pode se tornar o ouro comprado por outros.