Por que algumas células cancerosas resistem à radioterapia? Estudo explica
Tecmundo
Após a descoberta dos raios X por Wilhelm Röntgen, em 1895, tiveram início as primeiras sessões de radioterapia para tratamento do câncer. O procedimento envolve feixes de radiação direcionados exatamente para o tumor para que as células cancerosas, mais sensíveis à radiação, tenham seu DNA atacado e morram.
No entanto, por um motivo que há décadas desafia a compreensão dos cientistas, a exposição à radiação mata células de tumores iguais de formas diferentes. Isso é importante, pois algumas dessas mortes passam despercebidas pelo sistema imunológico, enquanto outras incitam uma resposta imune que mata as células cancerosas remanescentes.
Agora, um estudo publicado recentemente na Nature Cell Biology garante ter solucionado o mistério. Após passar seis anos pesquisando a questão, o autor principal, Radoslaw Szmyd, da Universidade de Sydney, em Westmead na Austrália, conseguiu resolvê-la após rastrear células irradiadas por uma semana, com microscópios de última geração.
Como funciona a radioterapia na prática?
Em um cenário ideal, o tratamento do câncer libera o sistema imunológico do paciente para matar células cancerosas e limpar tumores. Para isso, a radioterapia que mata algumas células neoplásicas, “denuncia” sua presença ao sistema imunológico, que mata aquelas que sobreviveram à radiação direta.
No entanto, o que seria uma estratégia literalmente matadora para a sobrevivência de muitos pacientes acaba falhando, porque algumas dessas células malignas morrem de maneira incorreta, ou seja, não imunogênica. Isso significa que parte das mortes faz só metade do trabalho, e não libera sinais capazes de ativar o sistema imunológico.
Para o coautor Tony Cesare, professor do Instituto de Pesquisa Médica Infantil de Sydney, "O resultado surpreendente de nossa pesquisa é que o reparo do DNA, que normalmente protege as células saudáveis, determina como as células cancerosas morrem após a radioterapia", afirma ele em um comunicado.
Por que o reparo do DNA nem sempre reconhece as células irradiadas?
Fundamental para o funcionamento das nossas células, o DNA está o tempo todo sujeito a danos causados por processos metabólicos naturais, produtos químicos e a radioterapia. Embora o material genético corrija os danos, nesse último caso, os danos são tão severos, que o próprio processo de reparo reconhece a gravidade e “sinaliza” para que a célula inicie sua autodestruição (apoptose), o que faz do DNA uma ferramenta de combate ao câncer.
Se esse reparo fosse capaz de funcionar de forma que as células malignas não morressem, a radioterapia seria inócua. Mas as doses são calibradas de tal maneira, que, na maioria dos casos, causam danos além da capacidade de recuperação do processo de reparo.
No entanto, pondera Cesare, "Quando o DNA danificado pela radioterapia foi reparado por um método chamado recombinação homóloga, as células cancerígenas morrem durante o processo de reprodução — um mecanismo chamado divisão celular ou mitose". Nesses casos, a morte passa totalmente despercebida pelo sistema imunológico, e não ativa uma resposta imune.
Como ativar o sistema imunológico nos casos de morte durante a mitose?
A solução para que o corpo inicie uma resposta imune capaz de combater o câncer de uma maneira mais ampla, raciocinaram os autores, foi bloquear a recombinação homóloga (mecanismo de reparo que utiliza uma cópia intacta do DNA como molde). Tendo que se reparar de outras formas, as células acabariam flagradas pelo sistema imunológico, e mortas.
A hipótese foi testada em experimentos em cultura, e confirmada, pois as células liberaram interferons, proteínas produzidas pelas células do sistema imunológico em resposta a infecções virais e células tumorais. No entanto, a eficácia ainda precisa ser demonstrada em modelos animais e em ensaios clínicos.
Alguns medicamentos que inibem a recombinação homóloga , como os inibidores da enzima ATR, podem aumentar a eficácia da radioterapia, permitindo reduzir as doses. Uma mutação no gene BRCA2, ligada ao câncer de mama, também impede a recombinação homóloga e, portanto, a morte durante a mitose. Como outra mutação aumenta o reparo, os autores estão explorando novas estratégias terapêuticas para melhorar os tratamentos.
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