Budas de Bamiyan: Como o Talibã deu fim a duas estátuas importantes do Afeganistão
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Após meses de combate, o Talibã, conseguiu tomar a cidade de Bamiyan. Com isso, os moradores da região — que são, em grande parte, xiitas, ou seja, considerados inimigos pelo grupo muçulmano, que são sunitas — acabaram fugindo ou sendo capturados.
Muitos deles foram mortos, outros feitos de refém. Já uma pequena parcela foi obrigada a ajudar o grupo autodenominado “Estado Islâmico” a mostrar tudo aquilo do que são capazes. Esse fato pode até parecer algo que aconteceu recentemente no Afeganistão, mas ele remete a uma triste e marcante passagem da primeira vez que o grupo dominou o país.
Em maio de 1999, Mirza Hussain, que tinha 26 anos, não tinha outra alternativa a não ser seguir à risca as ordens do grupo radical. Assim, ele foi um dos reféns que colocou bombas nas famosas estátuas de Buda que ficavam na cidade.
Como explica matéria da BBC, as esculturas eram consideradas as mais altas estátuas de Buda do mundo. Feitas de arenito, elas foram exterminadas em um ato que chocou o mundo e que jamais sairá da memória de Hussain.
"Primeiro, eles atingiram os Budas com tanques e disparos. Quando viram que não fazia efeito, colocaram explosivos para destruí-los", conta o afegão à BBC. "Eu estava junto com 25 prisioneiros. Não havia civis na cidade, apenas combatentes do Talibã".
"Fomos escolhidos porque não havia mais ninguém. Éramos prisioneiros e tratados como pessoas que poderiam ser descartadas a qualquer momento”, explica Mirza, que foi entrevistado pelo veículo britânico em 2001.
Na ocasião, o xiita explicou que ele e os outros reféns, quando viram o grupo radical levar dinamites e armas ao local, sabiam que poderiam morrer a qualquer momento, seja pela fúria dos guardas ou nas estrondosas explosões.
"Quando um dos homens, que tinha um problema na perna, não conseguiu mais carregar os explosivos, o Talibã atirou nele na hora e deu o corpo a outro prisioneiro, para que ele o descartasse”, conta.
Para colocar explosivos ao redor da enorme estátua de 55 metros de altura, Mirza relembra que ele e outros reféns demoraram cerca de três dias. Após isso, em instantes, a construção foi detonada enquanto os radicais gritavam ‘Allah Akbar’ (uma expressão que significa ‘Deus é grande’).
Diversos países condenaram o ato, mesmo assim, o Estado Islâmico não recuou, muito pelo contrário, eles levavam cada vez mais explosivo ao local. Em pouco tempo sobraria apenas entulho das esculturas que remetiam ao século 6.
"A partir de então, eles faziam duas ou três explosões por dia para destruir os budas completamente. Fazíamos buracos nas estátuas para plantar dinamite. Não tínhamos as ferramentas adequadas. O processo todo durou 25 dias”, explica o xiita.
O duro ato de sobreviver
Enquanto foi mantido de refém, Hussein diz que era tratado as duras penas. Na parte da alimentação, ele recebia apenas um pouco de pão e arroz.
Já para dormir, tinha que enfrentar o frio das noites com a roupa que tinha no corpo — que não trocou durante todo o tempo que foi feito de refém — e um fino cobertor.
Despois que a última estátua foi resumida a pó, o afegão lembra que o Talibã celebrou. "Eles dispararam tiros ao ar, dançaram e levaram nove vacas para serem sacrificadas”. Após passado todos esses anos, só resta a Mirza o remorso:
"Lamentei na época, lamento agora e sempre lamentarei (...), Mas não tinha como resistir, não tinha escolha, porque eles teriam me matado”.
Após os atentados de 11 de setembro, os Estados Unidos, sob o comando de George W. Bush, invadiram o país e expulsaram as tropas do Talibã do poder — motivados pelo fato do grupo radical ter se recusado a entregar o líder da al-Qaeda, Osama bin Laden.
Assim, as tropas americanas foram alocadas no país. Porém, após duas décadas de ocupação, o presidente Joe Biden anunciou que retiraria os soldados a partir de 1º de maio deste ano. Agora, sem empecilhos no caminho, o Talibã lançou uma ofensiva e retomou o controle da capital do país nos últimos dias.