Como funcionava a censura durante a ditadura militar no Brasil?

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Em 1964, um golpe instaurou a ditadura militar que durou até 1985 e ficou marcada pela censura prévia de músicas, peças teatrais, novelas, livros, filmes e jornais. Essa política de controle visava ocultar problemas sociais e econômicos, impedindo denúncias contra o governo e promovendo uma imagem de estabilidade.
Em entrevista ao g1, o professor Mateus Gamba Torres, da UnB, explicou que o regime censurava temas considerados contrários aos “bons costumes” – como sexualidade, denúncias de fome, problemas sociais e manifestações de racismo –, classificando tudo o que contestasse o governo como comunista.
No início da ditadura, a censura era aplicada de forma não oficial, por meio de mensagens enviadas aos veículos de imprensa instruindo-os a evitar determinados assuntos ou notícias.
Alguns jornais, para driblar essa interferência, substituíam matérias censuradas por poemas. No entanto, não demorou para que o controle da informação fosse oficializado por meio de normas rigorosas.
Medidas de controle
Em 1967, o presidente Humberto Castelo Branco sancionou a Lei de Imprensa, que regulava a liberdade de manifestação do pensamento e da informação. A norma previa penas de detenção para quem divulgasse propaganda considerada subversiva ou publicações que atentassem contra a moral e os bons costumes.
No ano seguinte, o Ato Institucional nº 5, assinado pelo presidente-marechal Artur da Costa e Silva, ampliou ainda mais a repressão, instituindo a censura prévia, suspendendo o habeas corpus para crimes políticos e permitindo o fechamento do Congresso Nacional.
A perseguição a manifestações consideradas inadequadas pelo regime se intensificou em 1970, com o chamado Decreto Leila Diniz, assinado pelo ex-presidente Emílio Garrastazu Médici e o ex-ministro da Justiça Alfredo Buzaid.
A norma proibia a divulgação de conteúdos "contrários à moral e aos bons costumes", autorizando a busca e apreensão de publicações consideradas ofensivas. Como resultado, censores passaram a atuar diretamente nas redações de jornais e revistas, decidindo o que poderia ou não ser publicado.
Segundo Torres, o decreto carrega nome porque foi publicado poucos meses depois que a atriz Leila Diniz deu uma entrevista considerada polêmica para o jornal "Pasquim”, na qual falou 72 palavrões.
A censura prévia obrigava que periódicos e obras tivessem autorização para serem publicados, permissão essa concedida pelos órgãos censores do Distrito Federal e dos estados. O professor explicou que, se um estado não contava com um departamento de censura, o material tinha de ser enviado para Brasília, São Paulo ou Rio de Janeiro.
Um dos casos mais emblemáticos foi o de Chico Buarque, que em 1970 lançou a música "Apesar de Você", crítica à ditadura. Segundo Torres, a canção inicialmente foi aprovada, já que os censores, na época, não eram tão bem preparados.
Contudo, após seu sucesso, a canção foi censurada e, a partir desse episódio, Chico Buarque passou a enfrentar dificuldades para aprovar suas composições. O professor lembra que, após esse caso, o cargo de censor se tornou bastante disputado, com salários mais altos, exigência de curso superior e provas para os candidatos.
Ele ainda mencionou que Chico Buarque só conseguiu lançar o álbum "Sinal Fechado", em 1974, porque as canções foram atribuídas a outros artistas, chegando até mesmo a ser creditado um suposto compositor, Julinho da Adelaide, que na verdade não existia.

Fim da censura
A partir dos anos 1980, o cenário político brasileiro passou por transformações que refletiram na diminuição gradual da censura. Durante esse período, a pressão de políticos que defendiam a abertura democrática, juntamente com a mobilização de movimentos sociais, artistas e intelectuais, intensificou a crítica às práticas autoritárias herdadas do regime militar, conforme contou Torres ao g1.
A sociedade passou a exigir maior liberdade de expressão, e o combate à censura se tornou um dos símbolos da luta pela redemocratização. Esse processo de abertura culminou com a promulgação da nova Constituição Federal em 1988, um marco que oficializou o fim da censura prévia e reafirmou os direitos fundamentais de liberdade e expressão.


